Perplexidade e Silêncio
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Eba, finalmente um livro sobre viagem no tempo, meu tema preferido! Escrevo esta resenha empolgada - não pelo livro em si, mas pelo tema! - e falarei sobre "O Ministério do Tempo", de Kaliane Bradley.

Aqui no Perplexidade e Silêncio, temos muitos posts sobre livros de viagem do tempo. Se você gosta do tema, dê uma olhadinha aqui.

Um ministério governamental recentemente criado, o Ministério do Tempo, está reunindo o que eles denominam de “expatriados”, ou seja, viajantes do passado, coletados pelo Ministério em diversos pontos da história para determinar se a viagem no tempo é viável não apenas para o corpo mas, também, para a estrutura do espaço-tempo. Essas pessoas foram escolhidas após um extenso exame do Ministério de que a ausência delas não interferiria nos acontecimentos do mundo, assim, são pessoas que estavam à beira da morte em suas épocas e não tinham um papel significativo na sociedade.

Narrado em primeira pessoa, não sabemos o nome da personagem principal, então vou chamá-la de Protagonista. A Protagonista, de descendência cambojana, trabalhava no Programa de Idiomas do Governo e foi designada como ponte, ou seja, como a pessoa que vai facilitar a adaptação do expatriado ao mundo atual. Ela fica a cargo de Graham Gore, (uma pessoa que realmente existiu), um oficial da Marinha que morreu em uma expedição ao Ártico. Existem outras pontes e outros expatriados no enredo e, aos poucos, as relações entre eles começam a se aprofundar.

O começo da narrativa estava interessante, eu estava gostando de ler sobre a adaptação de Gore ao nosso mundo, em um momento de ficção especulativa que, por mim, teria sido o enredo principal da obra até o final. Meu interesse começou a declinar um pouco em dois momentos: quando Gore e a Protagonista engatam um romance, e quando a narrativa vira para um suspense de espionagem que, na minha opinião, foi fraca. Acredito que também tenha sido uma falha de edição, porque o ritmo muda abruptamente.

A história de espionagem é confusa e ligeiramente bobinha, mas deixo aqui para registro: a Protagonista descobre que dois personagens suspeitos, que aparecem em alguns momentos aleatórios da trama, são espiões enviados do futuro, e estes espiões desejam matar todos os expatriados e as pontes. Mais adiante, sabe-se que eles recebem informação de dentro do Ministério. Não é nada surpreendente quando descobrimos quem é o informante do Ministério, e também não foi um grande plot twist quando sabemos quem é que mandou os viajantes do futuro. 
E aqui vem meu comentário principal sobre histórias de viagem no tempo: não é qualquer um que consegue escrever uma história boa nesse gênero. É muito fácil o escritor se perder nas pontas soltas, nas explicações e nas idas-e-vindas pelo tempo. Bradley não fez um trabalho ruim, mas também não foi ótimo. Foi morno, confuso e mal explicado.

O que eu realmente gostei do livro foi de Maggie. Maggie é uma expatriada do século 17 que fica absolutamente encantada pelo nosso tempo. Ela é curiosa, destemida, extrovertida e carismática, e rapidamente se movimenta com desenvoltura. É interessante quando ela descobre o feminismo, o entendimento que ela absorve deste conceito, e sobretudo quando ela percebe que, no nosso século, ela tem liberdade para "amar mulheres". 
Para mim, o livro seria muito mais rico se o conflito central fosse a Protagonista perdendo Maggie, e não Graham. Achei um baita clichê o relacionamento amoroso dos dois, que me deixou entediada (mesmo com as cenas hot), e seria muito mais criativo se a Protagonista lutasse por Maggie - e não necessariamente num sentido romântico, mas Maggie é muito mais legal para o enredo que Graham.

No fim das contas, é uma leitura agradável, que distrai, desde que o leitor não fique tentando conectar as pontas soltas da viagem do tempo (como eu fiquei).
Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 3/5


Faz bastante tempo que este livro está na minha lista de leituras e, finalmente, dei prioridade a ele. Na resenha de hoje, falarei sobre o primeiro volume de "Os Similares", de Rebecca Hanover.

"Os Similares", de Rebecca Hanover, é narrado em primeira pessoa por Emmaline. Ela chega ao terceiro ano da Academia Darwook com o coração partido, pois seu melhor amigo, Olive, tirou a própria vida alguns meses antes. Quando o ano letivo começa, seis clones chegam à Academia, levantando uma grande polêmica sobre os direitos deles de estarem ali. Para Emma, a coisa se complica ainda mais quando um deles é o clone de Oliver, chamado Levi, e Emma percebe que está se apaixonando por ele, sendo que nunca tinha nutrido sentimentos românticos pelo melhor amigo.

Emma tem uma outra amiga, chamada Pru, que sofre uma tentativa de assassinato e desaparece. A partir deste momento, Emma resolve investigar os bastidores do que acontece em Darkwood e com os clones. Ela também presencia manifestações de força física e atleticismo fora do padrão com os clones, o que desperta a suspeita de que eles tenham algum tipo de "poder".

A parte que eu mais gostei do livro foi a discussão sobre a inclusão social dos clones, que pode ser expandida e usada para debater muitos temas da nossa sociedade atual, e até mesmo nos faz pensar no futuro das IAs. Emma representa as pessoas que defendem os direitos dos clones, enquanto alguns colegas de Darkwood acreditam que eles não deveriam ser tratados como seres humanos. Achei um debate atual e interessante, que foi trazido à narrativa na medida certa.

Eu também gostei da primeira metade da história, pois a combinação de ficção-científica e suspense (o desaparecimento de Pru) estava bem interessante. Apesar do grande clichê "adolescentes ricos em escola de elite" - já comentei aqui em várias resenhas que estou super cansada dessa fórmula - me mantive curiosa para saber onde a narrativa dos clones iria chegar.
Porém, da segunda metade em diante, parece que Hanover se perdeu no enredo e na própria escrita. A cena onde Emma e Levi fogem de Darkwood e vão para a ilha onde os clones foram criados beira o ridículo. Além da logística da fuga, em si, não fazer nenhum sentido, Hanover contradiz a si própria pois, até então, a ilha era referida como um lugar extremamente seguro, ermo e complicado de se entrar. 
Daí para frente foi só ladeira abaixo. A justificativa por trás da criação dos clones é não me convenceu. Basicamente, Hanover utilizou de outro clichê, o "cientista atormentado por aqueles que o subestimaram no passado busca vingança". Recebi esse elemento da narrativa com tédio, porque era exatamente o que eu esperava que fosse acontecer. Hanover poderia, ao menos, ter desenvolvido esse clichê de uma maneira mais sólida, para compensar um pouco as coisas, mas isso também não acontece. Ela só nos fornece alguns poucos capítulos de flashback para entendermos a história do criador, e nada mais. Achei tudo isso muito morno, quando, na verdade, deveriam ser o clímax do livro. Não funcionou.

O desenrolar do desaparecimento de Pru foi tão morno quanto o resto. Me fez pensar porquê colocá-lo na história para início de conversa. Foi somente uma distração bobinha.

Outro ponto que deveria ser um clímax da história também deixou a desejar, que é a descoberta de Emma sobre seu próprio passado. Foi uma descoberta tão óbvia que achei inocente da parte de Hanover acreditar que seria surpreendente, ou mesmo emocionante. Lá pelo quarto capítulo do livro já dava para perceber o caminho que Emma tomaria. 

Por tudo isso, não pretendo seguir a leitura da trilogia, e recomendo a leitura apenas para quem estiver buscando um livro descompromissado para uma leitura casual.

Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 3/5

 


A resenha de hoje é uma leitura bastante interessante da obra "A Vegetariana", da escritora sul-coreana Han Kang.

Aproveito para te lembrar que aqui no Perplexidade e Silêncio existe uma sessão chamada "Desafio Livros Pelo Mundo", onde li diversos autores fora do eixo Estados Unidos - Reino Unido. Super recomendo que você dê uma olhadinha aqui.

Conheci Han Kang quando ela ganhou o prêmio Nobel de Literatura e, a partir daí, me interessei por ler alguma obra sua. Comecei com "A Vegetariana", publicado originalmente em 2007, que conta a história de Yeong-hye através do ponto-de-vista de três personagens: seu marido, seu cunhado e sua irmã. Cada ponto-de-vista é uma parte do livro, que nunca apresenta a narrativa da perspectiva da protagonista (o que achei muito legal, aliás).

Antes do início dos pesadelos, Yeong-hye e seu marido viviam uma vida normal e controlada, e Yeong-hye como uma mulher completamente sem personalidade e sem identidade. Porém, quando os pesadelos começam, com imagens violentas de sangue e brutalidade, Yeong-hye decide renunciar à carne, acreditando que isso fará com que os pesadelos parem. Porém, sua decisão repentina e radical desencadeia uma série de acontecimentos ruins com seu marido e, eventualmente, com o restante da sua família, resultando que Yeong-hye tenta tirar sua própria vida e é internada em um hospital psiquiátrico.

Logo suas tentativas de parar com os pesadelos se tornam desesperadas, submetendo primeiro sua mente, e depois seu corpo, a violações cada vez mais intrusivas e perversas, enviando Yeong-hye para um distanciamento perigoso e bizarro, não apenas daqueles mais próximos a ela, mas também de si mesma.

Antes de mais nada, é bom deixar claro que o livro não tem nada a ver com vegetarianismo, e isso sequer é discutido no enredo. É um livro sobre crises existenciais, angústia, anseios, desejos e proibições. 

O que eu mais gostei deste livro é quão estranho ele é, e é uma estranheza proposital. Kang quer nos transportar para o mundo de Yeong-hye e isso não poderia acontecer se a narrativa do livro fosse tradicional. Eu fiquei completamente entretida na história, querendo saber não apenas o fim da protagonista mas, sobretudo, como sua loucura atingiria a vida das pessoas ao seu redor. 
De todos os pontos-de-vista, o que mais gostei foi o segundo, do cunhado. Marido de sua irmã, ele se apaixona por Yeong-hye e, a princípio, parece ser a primeira pessoa que realmente vê a protagonista como ela é, mas logo se torna claro que Yeong-hye também é um objeto para ele, o que reforça ainda mais a anulação de sua identidade e personalidade, que começou na primeira parte com seu marido.
Mas é também o cunhado que oferece à protagonista e ao leitor o único momento de alegria de Yeong-hye, o que é recebido com alívio em meio a tanta insanidade.

Existem muitas camadas que podem ser discutidas com este livro, e isso por si só já me faz gostar da leitura. Existem cenas de assédio, misoginia e machismo, e a inatividade de Yeong-hye me parece ser uma maneira extrema de Kang jogar estes temas na nossa cara. Há também o passado de abuso da protagonista pelo pai, que abre uma outra cadeia de discussões. E há sua loucura, que me soa como um esforço imaginativo de Kang ao estilo "o que de pior pode acontecer com uma mulher como ela?". E, claro, não podemos esquecer o recorte cultural onde se passa a história, a Coreia do Sul, e todas as expectativas sociais existentes para a mulher neste país.

É uma leitura que eu recomendo muito.
Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 4/5


Na resenha de hoje, falarei sobre a primeira obra de Sarah Penner que tive a oportunidade de ler, "A Sociedade Oculta de Londres".

Publicado em 2023, a história de "A Sociedade Oculta de Londres" acontece no ano de 1873, na época vitoriana - o que, inclusive, me lembrou que aqui no Perplexidade e Silêncio temos um post da Deborah Mundin chamado "8 fatos sobre a Era Vitoriana que me deixaram puta". 

Lenna Wickes veio a Paris para encontrar respostas sobre a morte de sua irmã, Evie, mas para isso ela deve superar seu próprio preconceito lógico contra o ocultismo. Quando Vaudeline é chamada à Inglaterra para resolver o assassinato de grande repercussão de Sr. Wolckman, e Lenna a acompanha como substituta, em uma tentativa de se aproximar do ocultismo ainda mais. Alguns capítulos são narrados em terceira pessoa, do ponto-de-vista de Lenna.

Há também o enredo narrado através da perspectiva de Sr. Morley, em primeira pessoa. Ele é o Vice-Presidente da Sociedade Mediúnica de Londres, responsável pelo departamento de Espiritualismo. Seu antecessor, o Sr. Wolckman, foi brutalmente assassinado, e foi Morley quem descobriu o corpo na adega de sua casa. Os membros da Sociedade esgotam todos os meios para estabelecer contato com o espírito de Wolckman, até mesmo colaborando com as autoridades, mas os seus esforços revelam-se infrutíferos na descoberta da identidade do assassino. É aí que Sr. Morley contrata os serviços de Vaudeline, reconhecida como uma das melhores médiuns da Europa.

A ambientação da história é interessante, fazia tempo que eu não lia um enredo desenvolvido na era vitoriana, e também gostei do tema ao redor das sessões mediúnicas - as séances - que eram muito populares no século 19. Porém, o mérito do livro termina aí, infelizmente. Ele é fraco e não se sustenta por diversos motivos, e tentarei resumi-los.

O primeiro problema, para mim, foi o excesso de explicações. Senti como se Penner estivesse subestimando não só minha inteligência, mas também minha memória e meu raciocínio lógico. Houve momentos que Penner acabava de nos apresentar uma descoberta de Lenna e, logo depois, parágrafos adiante ou no capítulo seguinte, Penner repetia e reexplicava tudo outra vez - e ela fez isso várias e várias vezes ao longo da narrativa, o que deixou a leitura muita cansativa, e até mesmo boba. Cheguei a me perguntar se eu estava lendo algum livro infantil, mas aí lembrava da cena de masturbação inicial (completamente fora de contexto) e me lembrava que não. Era só Penner sendo uma escritora fraca mesmo.

O segundo problema, e este é maior que o primeiro, é que não há nenhum suspense numa história que deveria ser de suspense. Quando Lenna descobria algo sobre a morte de Evie, ou quando o Sr. Morley nos fornecia um pedaço do quebra-cabeças através de seus capítulos, não senti surpresa, ou encantamento, ou mesmo interesse. E de novo coloco a responsabilidade disso na escrita de Penner, que falhou ao construir o clímax, assim como falhou ao trazer a atmosfera de mistério que um thriller merece. A escrita me soou sem vida e sem personalidade, e mesmo o cenário vitoriano pareceu moderno demais. 
Quando finalmente descobrimos o que aconteceu com Evie e com o Sr. Wolckman, não senti absolutamente nada, apenas um alívio de que a história estava chegando ao fim.

Existe certo mérito em Lenna e Sr. Morley. Eles são personagens bastante diferentes, e achei interessante o contraste entre ambos. Eu gostaria de ter lido mais sobre Vaudeline, além da camada sedutora que Penner criou, parecia haver muito potencial ali.

No final das contas, o que eu senti foi que Penner não estava preparada para construir a história que ela imaginou. Faltou uma certa qualidade técnica, que deixou a coisa toda com um ar amador e, por isso, não é uma leitura que recomendo.

Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 2/5

 

Neste post, trago a conclusão da trilogia "A Guerra da Papoula", intitulado "A Deusa em Chamas" e escrito por R. F. Kuang. Será que valeu a pena ler a série toda? 

Caso você queira ler as resenhas dos outros dois volumes, veja os posts abaixo:
Sugestão de Leitura | A Guerra da Papoula, de R. F. Kuang
Já Li #192 - A República do Dragão, de R.F. Kuang

Depois de salvar sua nação, Nikan, de invasores estrangeiros e lutar contra a Imperatriz Su Daji em uma guerra civil brutal, Fang Runin foi traída por aliados e deixada para morrer. 
Apesar das perdas, Rin não desistiu daqueles por quem ela tanto se sacrificou: o povo das províncias do sul e especialmente Tikany, a aldeia onde ela mora. Voltando às suas raízes, Rin enfrenta desafios difíceis. Embora seus novos aliados na liderança da Coalizão do Sul sejam astutos e indignos de confiança, Rin rapidamente percebe que o verdadeiro poder em Nikan está nas milhões de pessoas comuns que têm sede de vingança e a reverenciam como uma deusa da salvação.
Rin, então, decide criar xamãs entre estas pessoas e, a partir do poder combinado entre ela e eles, derrotar os hesperianos de uma vez por todas.

A trilogia começou bem - foi até Sugestão de Leitura por aqui - mas infelizmente não posso dizer o mesmo do fim. Que livro chato. Tive muita, muita dificuldade mesmo, de terminar a leitura dele, e preciso ser sincera com vocês e dizer que eu pulei capítulos - sim, pulei capítulos, e eles não fizeram absolutamente nenhuma falta para o meu entendimento. Se eu soubesse disso, teria pulado direto para o último capítulo. Pois listo aqui os motivos de tamanha chatice:

A ausência de camadas de Rin não sustenta a narrativa do ponto-de-vista dela. Tudo se torna repetitivo, redundante, previsível, sobretudo depois de termos dois livros inteiros sobre ela. O arco do personagem é mínimo e, quando existe, não desvela novos ângulos de Rin, só reforça tudo o que já sabemos sobre ela. 
Seria muito melhor se Rin aceitasse de vez sua natureza cruel, em vez de questioná-la constantemente. Querida, você já fez isso nos últimos dois livros e continuou fazendo isso neste livro, por favor, siga em frente. Ninguém sente pena de você neste momento. Você escolheu esse caminho, saboreie sua loucura.
Eu preferia ter lido mais sobre a perspectiva de Kitay, ou até mesmo Nezha.

As intermináveis descrições de estratégias de guerra, de andanças por cidades desoladas e de cadáveres humanos acabaram com meu interesse, que já estava negativo. As motivações de Rin para a guerra eram pífias, assim como as motivações de todos ao seu redor, tudo parecia requentado de outras histórias deste gênero. E, se eu quisesse essa monotonia de temas, teria escolhido ler Bernard Cornwell. Fiquei entediadíssima. 

Aí veio uma plot que pensei que salvaria o livro, que foi o reencontro dos xamãs mais poderosos de todos os tempos, mas que não deu em absolutamente nada. Foi ridículo. A sensação que eu tive foi de que Kuang não sabia o que fazer com eles na história e precisou dar um fim ao arco narrativo, mas foi um fim péssimo. Desperdício completo, que demonstra a imaturidade de Kuang como escritora de fantasia, e uma falta de habilidade técnica em encontrar caminhos genuinamente criativos para seu enredo.
Aí eu comecei a pular capítulos.

Ou seja, não recomendo a leitura da trilogia, e sigamos para a próxima!

Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 2/5


Eu já estava com saudades de fazer um post comparando um livro ao filme ou à série, e finalmente temos um conteúdo novo nesta sessão. Nesta análise, falaremos sobre a obra original de Stephen King, "Outsider", e a série de mesmo nome produzida pela HBO.

Se você gosta deste tipo de conteúdo, no Perplexidade e Silêncio tem várias análises de Livro x Filme, e Livro x Série. Veja os demais posts aqui.

Começando pelo livro, "Outsider" foi publicado originalmente em 2018. O enredo começa com a investigação de um crime brutal contra uma criança, e o detetive Ralph Anderson tem 100% de certeza de que o assassino é Terry, o técnico de futebol americano e baseball dos times infantis da cidade. Porém, conforme o tempo passa, o advogado de defesa de Terry apresenta provas irrefutáveis de que ele estava fora da cidade no dia do crime, e o que antes era uma certeza absoluta passa a ser um mistério. Terry acaba assassinado pelo irmão do garotinho morto, e, a partir daí, Ralph se vê em um espiral para baixo sem precedentes, até que encontra a investigadora Holly.
Holly, então, traz uma perspectiva completamente diferente à investigação, sugerindo que o real assassino não é humano.

Dois anos depois, a HBO lançou a série baseada neste livro, que consiste em uma temporada com dez episódios. O livro já tinha me trazido uma energia "Supernatural", a série dos irmãos Winchester e, como uma fã de Supernatural, para mim a história foi zero surpreendente. Com um capítulo do livro e um episódio da série, já tinha desvendado o tal mistério e, por isso, achei alguns momentos de ambas as obras meio "bobos". Mas, imagino que para muita gente o desenrolar da história foi interessante.

Trouxe as principais diferenças entre as duas obras:

O arco do personagem Ralph Anderson
Ralph, o protagonista do enredo, é um detetive determinado em uma cidade pequena dos Estados Unidos chamada Flint City (como tudo o que acontece nos livros de Stephen King. Ele tem zero repertório de geografia e culturas diferentes, aliás). No livro, ele tem um peso menor para o desenrolar da narrativa, que acaba se dissolvendo um pouco entre Holly e os demais policiais envolvidos na investigação. Na série, acredito que eles fizeram um ajuste ótimo pois, não apenas deram uma back story para Ralph (o filho dele morre na série, mas não no livro), como o colocam como o principal interlocutor com a criatura misteriosa. Foi uma mudança excelente, que trouxe muito mais profundidade à história.

Holly Gibney
É preciso dizer que eu adorei a personagem de Holly. Ela é excêntrica, antissocial, inteligente, e fora dos padrões. Na série, gostei muito da representatividade de terem colocado a Cynthia Orivo para interpretá-la, uma vez que no livro a personagem é loira e branca. O que não gostei muito foi terem dado um par romântico à Holly na série (Andy), algo que não existe no livro, e não entendi bem o motivo disso - foi puro machismo, de achar que toda mulher precisa de um parceiro, ou foi para adicionar drama? 
Gostei mais do final que deram à Holly na série, em contrapartida, inclusive fiquei interessada em uma continuação com ela em uma segunda temporada.

A família de Terry
Tanto o assassinato de Terry quanto a reação de sua viúva são bem mais impactantes na série. Inclusive mudaram o nome da viúva de Marcy para Glory, e não entendi porquê. De qualquer forma, na série, retrata-se muito mais a devastação da família de Terry após sua acusação e morte, e as consequências na vida da viúva e das duas filhas. Achei outra mudança bem pensada.

De forma geral, gostei do livro, embora não seja uma das obras-primas de Stephen King. Ele tem livros melhores, mas fiquei entretida, apesar de não surpresa com o desenrolar dos eventos, como mencionei anteriormente. Comparando com a série, a série me deixou mais presa à história, e acho que as mudanças feitas elevaram a obra de King para um nível mais emocionante e menos previsível. Por isso, recomendo a série.

 


O narrador deste livro é um dos mais curiosos que já li, e "Enclausurado", de Ian McEwan, certamente vale a análise na resenha de hoje.
Aqui no Perplexidade e Silêncio, já tivemos a comparação entre livro e filme da obra "Reparação".

"Enclausurado" é um romance escrito por Ian McEwan, narrado em primeira pessoa pelo feto, que está dentro do ventre da mãe, Trudy.
Trudy é casada com John, um poeta fracassado que a importuna constantemente recitando poesias que ela não tem o menor interesse de ouvir. Já separados, Trudy tem um caso com Claude, irmão de John. Juntos, Claude e Trudy planejam assassinar John para poderem ficar juntos e herdar sua propriedade.

Enquanto a trama principal se desenrola, o feto-narrador acompanha os eventos e conversas que ocorrem fora do útero e ele percebe que Claude não deseja que ele viva, pois percebe que a mãe jamais o menciona como parte dos planos futuros. O feto não sabe se será morto assim que nascer, ou se será abandonado pelo casal, o que gera muitas especulações a respeito do futuro.
O feto-narrador também percebe que Claude não tem a intenção de continuar com Trudy, pois tudo o que ele quer é o dinheiro das propriedades do falecido irmão. Trudy lida com a culpa pelo assassinato de John, enquanto a frieza de Claude surpreende o feto-narrador.

É lógico que a leitura deste livro exige de nós uma certa abstração, já que o feto-narrador "vê" coisas que ele obviamente não veria de dentro do útero, e sabe de detalhes que ele não teria acesso. Isto posto, é uma leitura ótima. O feto-narrador tem uma personalidade marcante e é um excelente ponto-de-vista para um enredo que, de outra maneira, não seria exatamente original.
O enredo tem também um pouco de suspense policial, pois acompanhamos o planejamento e a execução de um assassinato. 

À medida que a história avança, o leitor é confrontado com questões morais, existenciais e políticas. O feto-narrador questiona sua própria existência, a ética do assassinato planejado e a natureza da vida em sociedade. Através de um estilo de escrita eloquente e provocador, Ian McEwan explora temas como liberdade, amor, conspiração e poder.
Em geral, e contrariando minhas vagas lembranças de McEwan (tive que puxar na memória "Reparação"), o tom geral é otimista. Embora a história seja trágica, ainda assim a mensagem que emerge do texto é que contar histórias sobre tragédias é a nossa melhor esperança de lidar com elas. Afinal, não há nada que o feto-narrador possa fazer para agir sobre ou influenciar os eventos; o que ele pode fazer é pensar sobre eles, analisá-los, falar sobre eles, brincar com palavras e ideias e conceitos. 

É uma leitura que recomendo.
Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 3/5

 

Aqui estou eu, mais uma vez falando sobre uma obra de V. E. Schwab. Agora, a resenha será sobre o segundo volume da trilogia "Vilões", chamado "Vingança".
Caso você queira saber sobre o primeiro volume, veja este post: Já Li #196 - Volume 1: Vilão, de V. E. Schwab

O segundo volume desta trilogia começa do ponto onde o livro anterior parou, e os caminhos separados que Eli e Victor tomaram após o desenrolar da última narrativa. Porém, desta vez, temos novos personagens, sendo as principais Marcela Higgins, que renasce depois de que seu marido tenta matá-la em um incêndio, e June, que é uma metamorfa com o poder se transformar sua aparência em qualquer pessoa que ela já tenha tocado.
Eli está preso em uma instituição que enclausura EOs chamada One, devido às suas habilidades potencialmente destrutivas da sociedade, sendo vítima de sucessivas torturas de um médico que quer entender como o poder dele funciona. As ceas de tortura, inclusive, foram gráficas demais para o meu estômago.
Victor, depois de ter sido ressuscitado por Sidney, está doente, e busca alternativas para sua condição, enquanto Sidney e Mitch são obrigados a mudar de cidade em cidade enquanto Victor tenta encontrar algum EO que o cure.
E Marcela, agora a EO mais poderosa da cidade de Merit, ao lado de June, quer estabelecer seu domínio com a máfia local. A One não gosta de como ela chama a atenção para si e para os outros EOs, e tenta prendê-la.

Depois de refletir um pouco sobre a leitura, percebi que eu gostei da história, mas não gostei do desenvolvimento dos personagens. Vou tomar como exemplo Marcela. Ela aparece logo no início da narrativa e o seu arco estava indo muito bem até a metade do livro, pois Schwab realmente nos faz acreditar que ela é imbatível e que nenhum EO será capaz de derrotá-la. Isso cria a impressão de Marcela irá tornar-se o pilar principal do enredo, o que seria muito interessante, mas, no final das contas, Marcela não chega a lugar nenhum, e tem um final bastante murcho. 
Senti que o mesmo aconteceu com alguns personagens coadjuvantes, como Jonathan e Dominic, e sobretudo com Sidney. Neste livro, o dilema principal de Sidney é sobre ressuscitar (ou não) sua irmã Serena, mas seu arco não se desenvolve de fato, e até cheguei a sentir que Sidney foi meio "inútil" neste volume.

Ainda sobre Sidney, é possível perceber a ideia inicial que levou Schwab a escrever "Fios do Poder". Creio que a semente nasceu ali.

Senti a mesma frustração com a relação entre Eli e Victor, já que eles passam o enredo todo separados. Eles só se reencontram nos últimos capítulos, e achei que este reencontro não foi tão inspirado como poderia ser. Talvez Schwab o tenha feito assim de propósito, para ficarmos ansiosos pelo terceiro volume, mas comigo não funcionou muito bem.
No entanto, gostei de June, e achei ela a personagem mais interessante da trilogia. Fiquei intrigada por conhecer quem ela realmente é, e por ela pretendo ler o terceiro volume. Quero saber o que acontece com ela.

Agora, um ponto que achei bastante negativo é o ir-e-vir da linha do tempo. No início de cada capítulo, Schwab coloca uma observação como, por exemplo, "cinco anos atrás", "três anos atrás", "semana passada", "dois meses atrás", conforme ela mostra os pontos-de-vista de cada personagem. Achei muito confuso e me deixava ligeiramente desanimada de seguir com a leitura.

Mas, no geral, é um livro bom, que recomendo para quem já começou a trilogia.
Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 3/5

 

Na resenha de hoje, retornamos às histórias clássicas de ficção-científica, e o livro escolhido da vez é "Olho no Céu", de Philip K. Dick.
Caso você goste do autor, confira também estes posts:
O livro ou o filme? | Minority Report, de Philip K. Dick
O livro ou o filme? | 8 coisas que não aparecem em Blade Runner
Top 5 | Cinco livros sobre dimensões paralelas

Originalmente publicado em 1957, as premissas desta história ainda são passíveis de debate até hoje, sobretudo no que é relacionado a política e polarização.

Enquanto passeava no Belmont Bevatron, um laboratório de Ciência Avançada, Jack Hamilton, junto com outras sete pessoas (incluindo sua esposa), sofre um acidente. O acidente ocorre depois que ele descobre que sua esposa, Marsha, está sendo investigada como comunista, e ele é demitido por causa disso, uma vez que o Bevatron trabalha para o governo americano e não pode "se expor a este risco de segurança".
Quando Hamilton recupera a consciência após o acidente, ele acorda em um mundo baseado nos princípios morais do Antigo Testamento, um lugar de pragas instantâneas, condenações imediatas e morte para todos os infiéis. Hamilton descobre como ele e as outras sete pessoas podem escapar deste mundo e regressar ao mundo real. Mas, primeiro, eles passarão por outros três outros mundos, cada um mais perigoso do que o anterior.
Estes mundos são construídos a partir das mentes das pessoas acidentadas. A explicação é que a radiação emitida pelo acidente os conecta de alguma maneira, e eles são capazes de "passear" pelos pensamentos uns dos outros. 

Dick tornou realidade o sonho de um fundamentalista religioso, uma sociedade unida pela fé nas suas crenças rígidas, na qual a ciência e a religião se fundem na busca do canal mais eficiente de comunicação com Deus. O próprio Sistema Solar é bíblico onde a Terra é o centro do cosmos e fica sobre um vasto campo de mineração chamado Inferno. Somos monitorados de cima por um olho enorme, que tem muito pouca visão da condição humana, e somente responde à subserviência humana.
Ninguém trabalha por salários, mas por créditos de salvação que são determinados pela posição da pessoa na sociedade. O próprio Deus prega aos domingos através de uma rede de televisão. O racismo e o militarismo são obrigatórios.

Mas este é apenas um dos mundos de fantasia contidos em "Olho no Céu". Existe um modelo distinto para cada uma das vítimas do acidente e cada um tem sua própria visão da realidade e dos costumes adequados aos quais os seres humanos deveriam aderir. 
Há, por exemplo, o mundo da Sra. Edith Pritchett, que elimina todas as doenças, dores e inconveniências. O que aparenta ser um ótimo lugar para eles se estabelecerem, logo se torna outro pesadelo, uma vez que a subjetividade do que incomoda Edith logo se torna absurda e aleatória. 
O terceiro mundo é de Joan Reiss, uma mulher ansiosa e paranoica que vê terríveis ameaças em tudo e em todos, o que colabora para que sua dimensão seja aterrorizante.

Dick tem uma ideia interessante para uma hipótese de mundos múltiplos baseada na teoria quântica (formulada pela primeira vez pelo físico Hugh Everett em 1957, no mesmo ano em que Dick publicou a sua história. Quem inspirou quem?). A sugestão de Dick é que a possibilidade de mundos paralelos se baseia numa experiência inteiramente subjetiva que pode ser projetada na consciência de outros. 
Eu preferiria se Dick tivesse elaborado e desenvolvido mais a ideia do mundo do Antigo Testamento, que vem da mente do idoso veterano Arthur Sylvester. Achei que esta parte da narrativa tinha mais potencial e poderia ser trazido com maior profundidade.

Só não gostei mais do livro porque não gosto muito do estilo de escrita de Dick, e isso vale para todas as obras deles que já li. As ideias são excelentes, o peso que ele tem para o mundo da ficção-científica é indiscutível, mas, a mim, falta alguma coisa. Já sei o quê - falta carisma, nos personagens e no ritmo que o próprio Dick impõe ao enredo. Mas, ainda assim, é uma leitura que recomendo.
Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 3/5

 

E não é que V. E. Schwab vem construindo um lugar na minha prateleira de escritores preferidos? Na resenha de hoje, trago o primeiro volume de sua nova série, "Os Frágeis Fios do Poder". 

Antes de mais nada, é bom notar que esta série é uma continuação de sua trilogia "Tons de Magia". Porém, não é necessário ter lido esta trilogia para entender a história, mas fique ciente de que você será bombardeado de spoilers. Aqui no Perplexidade e Silêncio, você pode conferir as seguintes análises:
Sugestão de Leitura | Tons de Magia, Vol. 1: Um Tom Mais Escuro de Magia, de V. E. Schwab
Já Li #143 - Tons de Magia, Vol.2: Um Encontro de Sombras, de V. E. Schwab

Ainda sobre V. E. Schwab, navegue também pelas resenhas de:
Sugestão de Leitura | A Vida Invisível de Addie LaRue, de V. E. Schwab
Já Li #196 - Volume 1: Vilão, de V. E. Schwab

Em "Fios do Poder", a história segue o mesmo universo de "Tons de Magia", sete anos depois de seu final, com a existência de quatro Londres, em quatro mundos paralelos: a Londres Preta, a Branca, a Vermelha e a Cinza (que seria a Londres do nosso mundo real). Depois dos acontecimentos envolvendo Lila, Kell e Holland, os portais entre as Londres foram selados, isolando, assim, o Mal que habitava a Londres Preta. Acompanhando estes eventos, V. E. Schwab traz novos personagens e novos desenvolvimentos a partir do final desta outra série.

O livro reveza o protagonismo entre diversos personagens. Nas sessões destinadas à Londres Vermelha, apesar de termos a participação importante de Alucard (de longe meu personagem preferido), Lila e Kell, a real protagonista é Tes, que eu adorei. O poder mágico de Tes é conseguir não apenas ver os Fios do Poder que os seres vivos e objetos emanam, mas também consertá-los e manipulá-los. Ela usa este poder consertando objetos mágicos danificados em uma lojinha discreta, mas seu sossego será perturbado quando um objeto muito maligno chega para reparo.
Na Londres Branca, a protagonista é Kosika, uma jovem rainha de apenas catorze anos de idade, que consegue falar com o fantasma de Holland para governar o império. Kosika percebe que a magia da Londres Branca está definhando, e busca alternativas de reavivar esta magia através de rituais de sangue coletivos. Porém, mesmo estes rituais já não estão funcionando, o que a coloca em contato com a tentação deliberar o portal para a Londres Preta, de onde a magia nasce.

Neste primeiro volume, a maior parte da narrativa foi usada principalmente no preenchimento dos anos que faltavam aos personagens e no que acabaria por levá-los ao ponto de encontro do clímax inicial. Parece mais uma introdução de um interlúdio – preenchendo as lacunas para explicar o que aconteceu com os personagens originais que levariam à história real. Foi um começo agradável e interessante, considerando que é necessário tempo e paciência para conectar tantos personagens e eventos.
Tes e Kosika podem ser peões involuntários no grande esquema das coisas, mas ainda existe o potencial latente de seus personagens para brilhar - com o tempo. Gosto mais de Tes, acho que ela tem potencial para ser alguém parecida com Lila, mas com um pouco mais de coragem e coração. Será interessante ver como será quando suas histórias realmente convergirem em uma só.

Por maior que seja o elenco, Schwab costurou suas histórias de uma forma muito bem equilibrada, que pudemos ver a progressão em cada uma de suas personalidades e estilos de vida e como suas vidas foram afetadas nos últimos sete anos.
Tenho uma queda por Rhy e Alucard. Adoro ver quão carinhoso e protetor Rhy é com Alucard, e a figura da filha deles, Ren, deu um toque emocionante à história. Nadiya, Rainha e mãe de Ren, também é uma excelente novidade na trama, e mal posso esperar para saber o que ela fará nos próximos volumes.

Gostei de ver alguns personagens mais antigos de uma nova perspectiva, e este volume trouxe muito mais de Alucard, o que sempre senti falta em "Tons de Magia". O elenco de personagens neste universo é bastante único, e achei que Schwab fez uma escolha acertada em dar mais destaque aos personagens novos. 
Ou seja, é uma leitura que super recomendo e que venha o segundo volume!

Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 4/5

 

A resenha de hoje, já adianto, é sobre uma decepção. A premissa de "As Últimas Crianças de Tóquio", de Yoko Tawada, chamou muito minha atenção, mas infelizmente a execução ficou a desejar. Neste post, falarei um pouco sobre a obra.

Publicado em 2014, "As Últimas Crianças de Tóquio" estabelece um futuro distópico onde o ar e a água ficaram envenenados, o que trouxe uma mudança drástica não apenas na configuração geográfica e política do mundo, mas também na constituição física das pessoas. Assim, as pessoas que já eram idosas na época deste incidente tornaram-se praticamente imortais, e alguém com 150 anos de idade é considerado jovem. Por outro lado, quem nasceu depois deste incidente apresenta uma saúde muito frágil, e cada geração é mais frágil que a anterior, ao ponto que já se sabe que, num dado momento, somente os idosos permanecerão vivos.
Aqui vem a primeira crítica ao livro, logo no parágrafo de introdução da resenha. Eu só fui capaz de explicar a vocês o contexto da história porque eu li artigos sobre a obra. Enquanto eu lia o livro, nada disso ficou claro, e eu passei uma grande parte da leitura sem entender nada deste mundo distópico. É possível apreender o que os personagens experienciam, mas nada em relação à construção do universo é claro, o que prejudica muito o andamento e o engajamento com a narrativa.

O livro começa narrado do ponto-de-vista de Yoshiro. Ainda jovem, Yoshiro completou recentemente cem anos de idade, e cuida de Mumei, seu bisneto. Mumei tem a saúde extremamente frágil - não consegue comer, não consegue engolir água, não fica em pé sozinho, etc - e Yoshiro se consome de preocupação com o futuro de Mumei e de toda sua família. Aos poucos, o autor traz a história dos outros personagens, ou seja, do restante da família de Yoshiro, e assim sabemos mais sobre o passado da mãe e do pai de Mumei.
Insiro aqui outra crítica. Não acho que Tawada fez um bom trabalho na construção das personagens. Yoshiro tem um papel interessante, uma vez que ele é a ponte (para o leitor) entre o passado e o presente, e ele seria o personagem que nos explicaria o que aconteceu, o que não funcionou. Mumei ganha destaque e personalidade na parte final do livro, mas até lá eu já estava completamente entediada e já não me importava com mais nada. O restante da família de Yoshiro como, por exemplo, sua esposa, também não apresenta o aprofundamento que uma ficção-especulativa pede.

E aí temos outro ponto. Ficção-especulativa e distopias pedem uma atmosfera própria. O ambiente da história faz toda a diferença, porque é ele que dará ao leitor o peso e a opressão da história e do universo criado. Tawada peca muito nisso. O autor só comenta sobre fronteiras geográficas e impactos econômicos, mas não tem nada de ambientação que caracterize o incidente que mencionei lá no começo. Não consegui imaginar como seria essa Tóquio nova, e isso é culpa do autor.

Tudo isso somado ao fato de que é uma história linear. Não existem pontos de clímax, nem ação ou algum tipo de antagonismo que faça a narrativa avançar. A leitura é chata, arrastada e entediante.
Assim, não é uma leitura que recomendo.

Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 2/5

 

Este post será uma mistura de resenha com reflexão pessoal. Ler o segundo volume dos diários de Virginia Woolf me fez pensar sobre várias coisas da minha própria vida, e quero compartilhar tudo isso com vocês.

Antes de começarmos, aqui no Perplexidade e Silêncio temos muitos posts sobre a obra de Virginia Woolf e vocês podem conferi-los aqui. Se quiserem ler a resenha do primeiro volume de seus diários, ela está disponível aqui.

A primeira reflexão que fiz ao ler sobre seus diários é sobre a chegada dos 39 anos de idade que, consequentemente, li exatamente na semana em que eu mesma fiz 39 anos. Virginia escreve sobre a sensação estranha que é perceber a velhice se aproximando e, ainda pior, a juventude se distanciando, no sentido de que algumas oportunidades perdidas parecem ainda mais definitivas e assustadoras. A chegada desta idade fez Virginia refletir sobre como a vida é trágica e, ao mesmo tempo, linda, e esses sentimentos profundos a deixaram melancólica e distante por vários dias. Tenho passado pelo exato mesmo processo atualmente, e me senti confortada em saber que minha escritora preferida passou pela mesma experiência, há 102 anos atrás. 

Junto com essa reflexão, no ano seguinte, quando Virginia completa 40 anos de idade,  lhe vem a constatação de que "não há mais volta" e ela não será mãe. Comenta sobre sempre ter sido muito consciente da decisão de não ter filhos - imaginem isso em 1920, era realmente muito revolucionário e chocante para a época - e, ao completar os 40 anos, Virginia percebe que dali em diante terá que lidar com as consequências desta decisão, que, para ela, são basicamente ao redor de uma velhice solitária sem ninguém para cuidar dela. Estou passando exatamente pela mesma reflexão, também, e foram trechos que mexeram bastante comigo ao longo da leitura.

Por outro lado, Virginia comenta que sente que encontrou sua própria voz somente aos 40, e dali em diante passa a receber as críticas negativas à sua obra de maneira muito mais leve. Já não busca tanto a aprovação dos críticos e intelectuais com quem convive e, mais que isso, começa a enxergar certa tolice e burrice neles, que antes dominavam seus pensamentos. 
Também me surpreendeu que Virginia, na época destes diários, tinha vendido "apenas" 800 cópias de seu livro "O Quarto de Jacob", o que era considerado muito. Mas é bizarro pensar que uma escritora do calibre de Woolf tenha atingido tão poucas pessoas de sua época, e tenha ficado realmente popular apenas depois de sua morte.
Também vemos ela começando a escrever o conto que daria origem à obra-prima "Mrs. Dalloway" e meu coração se encheu de alegria ao acompanhar o processo de algo que marcou a minha vida pessoal.

Gosto das partes que ela menciona seus contemporâneos Katherine Mansfield e Aldous Huxley. Sobre o diário em si, é um livro para fãs. Há que se dizer que, por vezes, é uma leitura chata, uma vez que Virginia fala de pessoas e coisas que para nós soa irrelevante, sobretudo a avalanche de nomes de nobres intelectuais entediantes. É uma leitura que só vale a pena para quem admira a escritora e quer saber mais sobre sua vida e sobre a forma como ela via o mundo. 

Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 3/5

 



A resenha de hoje é a coletânea de contos da escritora argentina Mariana Enríquez, chamada "Os Perigos de Fumar na Cama". 

"Os Perigos de Fumar na Cama", publicado em 2023, reúne doze contos inspirados em clássicos do terror: fantasmas, bruxas, brincadeiras com espíritos, visões e mortos que voltam à vida. Vou falar um pouquinho de cada um deles.

O desenterro da anjinha - O conto de abertura do livro é sobre uma moça que desenterra um esqueleto do quintal da avó, esqueleto este que a avó denominou de anjinha. Depois deste desenterro, o fantasma da anjinha começa a acompanhar a moça em tudo o que ela faz, e passa a fazer parte de sua vida cotidiana.
A Virgem da pedreira - Narrado na terceira pessoal do plural (o que achei incrível), o conto narra a inveja que um grupo de amigas tem da amiga negra deles, que consegue um namorado cobiçado e bonitão. Permeado por racismo, o conto trata de bruxaria e maldições. Bem escrito e interessante.
O carrinho - Depois de uma briga com moradores de um bairro, um homem em situação de rua larga seu carrinho para trás, com todas as suas quinquilharias nele. Imediatamente, o bairro todo começa a cair em desgraça, de assassinatos a suicídios, passando pela miséria extrema e desgraças em sequência. Também interessante. 
O poço - Uma menina faz parte de uma família extremamente medrosa, e ela mesma se torna assim, a ponto de ela não sair na rua nunca, sob nenhuma hipótese. Ela então descobre que este medo é uma maldição que, propositalmente, sua família deixou passar para ela. O começo do conto estava legal, mas achei o desfecho um pouco solto demais.
Rambla triste - Visitando um casal de amigos em Barcelona, uma jovem não consegue ignorar o cheio de podridão que sente pela cidade, que logo depois vem seguido do avistamento de uma criança, que a segue por todos os lados. Um conto sobre os fantasmas de criança que rondam Barcelona. Não sei se foi baseado em fatos reais ou lendas urbanas de Barcelona, e gostei do conto, poderia facilmente ser um livro.
O mirante - Um dos meus preferidos. Uma moça vai para um hotel isolado, em busca de alívio para sua depressão. Lá, ela encontra uma mulher que a leva e a prende em um mirante, até que "morra de loucura". Esta mulher é um fantasma que habita o hotel e que se diverte levando as pessoas ao suicídio. Este conto daria um excelente filme, consegui até imaginar trilha sonora e fotografia.
Onde está você, coração? - O conto sobre o fetiche mais bizarro que já li, e por isso mesmo um dos meus contos preferidos. O fetiche é sobre pessoas doentes e comer corações humanos. É disso para pior, mas vale a leitura.
Carne - Um conto sobre duas fãs de um cantor pop morto, que decidem violar seu túmulo para comer seus restos mortais. Achei mal desenvolvido e não gostei muito do tema.
Nem aniversários nem batizados - Acredito que Enríquez gostaria que este conto fosse sobre outro fetiche bizarro, mas acho que não funcionou muito bem. Um moço é contratado pelos pais de uma adolescente para filmarem o momento em que ela é abusada por espíritos. Deveria ser sobre voyeurismo, acho eu, mas não funcionou muito bem. Não gostei.
Garotos perdidos - Este conto também daria um ótimo filme! Crianças desaparecidas de Buenos Aires começam a aparecer espalhados pela cidade, ao mesmo tempo, sem que o tempo tenha passado para eles desde o dia do desaparecimento. Ninguém sabe o motivo deste fenômeno. Gostei muito, o meu favorito de todo o conto.
Os perigos de fumar na cama - Por ser o conto que dá nome ao livro, esperava mais. É sobre uma senhora que morre depois de um incêndio causado por seu cigarro, enquanto fumava na cama, e tudo indica que ela o fez de propósito. 
Quando falávamos com os mortos - Meninas adolescentes se juntam para brincar de ouija e invocam espíritos. O conto estava indo bem, mas terminou antes do que deveria, e eu não entendi muito bem o final. 

Mariana escreve muito bem. A forma como ela cria cenários e personagens complexos em tão poucos caracteres é louvável, e eu fiquei muito imersa nos mini-universos que ela criou, mesmo naqueles contos que não gostei tanto. É uma leitura simples, rápida, que eu recomendo. 

Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 3/5

 

Na resenha de hoje, falarei sobre o primeiro volume da trilogia Vilão, de V. E. Schwab. A leitura de Schwab costuma ser fácil e descomprometida, e é ótima para quando queremos ler uma fantasia interessante e despretensiosa.

Aqui no Perplexidade e Silêncio, você pode xeretar outras resenhas:
Sugestão de Leitura | A Vida Invisível de Addie LaRue, de V. E. Schwab
Sugestão de Leitura | Tons de Magia, Vol. 1: Um Tom Mais Escuro de Magia, de V. E. Schwab
Já Li #143 - Tons de Magia, Vol.2: Um Encontro de Sombras, de V. E. Schwab

Victor e Eli começaram como colegas de quarto na faculdade — garotos brilhantes, arrogantes e solitários que reconheciam um no outro a mesma perspicácia e ambição. No último ano, um interesse comum de pesquisa em adrenalina, experiências de quase morte e eventos aparentemente sobrenaturais revela uma possibilidade intrigante: que, nas condições certas, alguém possa desenvolver habilidades extraordinárias.

Dez anos depois, Victor foge da prisão, determinado a alcançar seu velho amigo (agora inimigo), auxiliado por uma jovem cuja natureza reservada obscurece uma habilidade impressionante. Enquanto isso, Eli tem a missão de erradicar todas as outras pessoas superpoderosas que puder encontrar - além de sua companheira, uma mulher enigmática com uma vontade inquebrável. Armados com um poder terrível de ambos os lados, movidos pela memória da traição e da perda, os arquiinimigos traçaram um caminho para a vingança.

É tudo sobre as ambições, as traições e os ciúmes de pessoas que são inteligentes demais para o seu próprio bem. Pessoas que trabalham juntas para obter o poder, mas cuja amizade é destruída por esse mesmo poder. Todos os personagens - incluindo o protagonista - têm lados sombrios escondidos sob seus exteriores calmos e controlados, o que para mim é o ponto alto da leitura. A divisão bem x mal não existe aqui, e eu adorei essa escolha de Schwab.

A história está dividida entre o presente e dez anos atrás. O presente conta a história de Victor, um condenado fugitivo, que está determinado a encontrar seu velho amigo que virou inimigo e realizar a vingança que arde dentro dele. Voltemos para dez anos atrás e Victor é um jovem estudante universitário brilhante que é praticamente inseparável de seu melhor amigo - Eli. Quando Eli propõe um plano para descobrir se existem EOs (Extraordinários), ele e Victor tornam-se parceiros num esquema que os levará ao inferno e de volta e talvez, apenas talvez, lhes conceda habilidades sobrenaturais. Gostei muito  do relacionamento complexo que existe entre eles, que oscila entre a admiração e o ciúme amargo, e como isso se desenvolvia à medida que cresciam e se tornavam mais obcecados pelo poder e por sua própria visão do certo e do errado.
Também gostei do tom que Schwab deu a Eli, que acredita ser um enviado de Deus, devido ao seu poder de ser imortal. 

O único elemento que não gostei muito foi como Schwab concebeu a transformação das pessoas em Extraordinários. Basicamente, a pessoa tem que passar por uma experiência de quase-morte e, quando ela retorna à vida, ela adquire o poder do que quer que estivesse sentindo naquele momento de desespero. As formas como Victor e Eli tentam quase-morrer na época da faculdade soaram meio bobas, às vezes até ridículas, e a explicação científica por trás dessa transformação também me pareceu forçada. 
Por outro lado, gostei que o tom da história é muito mais "Frankenstein, de Marry Shelley" do que Marvel. Essa atmosfera mais sombria, de suspense, me ganhou bastante.

De forma geral, gostei bastante da leitura e com certeza lerei o próximo volume.

Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 3/5

 


Sempre fico contente quando sei que lerei algo relacionado a viagem no tempo e, no post de hoje, falarei do segundo volume de "Antes que o Café Esfrie" de Toshikazu Kawaguchi.

A resenha do primeiro livro está aqui: Sugestão de Leitura | Antes que o Café Esfrie, de Toshikazu Kawaguchi.

Para quem não sabe a premissa das obras, conta a história de um pequeno café, escondido em uma viela, chamado Funiculi Funicula. Conta a lenda urbana de Tóquio que, neste café, é possível viajar no tempo, mas as pessoas logo desistem da ideia quando descobrem as regras desta viagem.
Assim como o volume anterior, os capítulos se alternam contando as histórias de várias pessoas, e algumas delas estão relacionadas às personagens do volume um.

Desta vez conhecemos quatro novos viajantes do tempo. Temos um homem que visita um querido amigo que morreu num acidente de carro há 22 anos e cuja filha ele criou como se fosse sua. Seu casamento iminente evoca culpa, pois ele nunca lhe contou a verdade sobre sua ascendência.
Também conhecemos um homem que não pôde comparecer ao funeral de sua mãe e viaja no tempo para vê-la novamente. O filho não teve uma vida fácil e conhecer a mãe revela-se uma experiência catártica, dando-lhe um novo sopro de vida.
Um homem com doença terminal viaja para o futuro para ver a mulher que amava e para garantir que ela leve uma vida feliz e não permitir que sua morte a impeça de encontrar a felicidade.
O último viajante do tempo é um policial próximo da aposentadoria que conhece sua falecida esposa no aniversário dela – um dia que ele perdeu por causa do trabalho – para lhe dar um presente.
Acho que o grande tema do livro é fazer com que o leitor se pergunte se valeria a pena voltar ao passado para encontrar alguém que já morreu, mesmo sabendo que você não poderá impedir a perda desta pessoa. 

O ponto negativo é que, se você leu o primeiro volume, este se torna um pouco repetitivo, já que Kawaguchi (re)explica as regras da viagem do tempo em cada conto. Eu até cheguei a pular estas partes, porque realmente fica cansativo. 
Outra coisa que me incomoda no estilo de Kawaguchi é que ele também explana demais os sentimentos, pensamentos e intenções de cada personagem. Por exemplo, se um personagem ficou incomodado com algo, nós, leitores, entenderemos isso através de sua linguagem corporal ou de seu tom de voz, mas Kawaguchi não gosta de deixar nada subentendido. Eu acho que ele peca pelo excesso, e que às vezes a leitura fica meio "boba".

O que mais gostei deste volume é que, finalmente, descobrimos quem é a fantasma que fica sentada na cadeira que viaja no tempo, que foi um mistério que percorreu todo o primeiro livro. 
Outra coisa que também adorei foi o fato de, pela primeira vez, temos uma viagem para o futuro. Achei a ideia bem interessante e também gostei como Kawaguchi imaginou o personagem para este conto.
Por fim, fiquei satisfeita em saber mais sobre a história de Kazu, e também pela nova personagem Miki. Espero que estas duas personagens sejam mais exploradas no terceiro volume.

É uma leitura que eu recomendo.
Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 3/5

 


Sigo na minha saga de ler todos os livros do maravilhoso Brandon Sanderson. O livro da resenha de hoje é "A Alma do Imperador".

Aqui no Perplexidade e Silêncio temos muitas resenhas do Brandon Sanderson. Se você quiser dar uma xeretada no que já passou por aqui, veja este link ou este Guia do Universo Cosmere.

"A Alma do Imperador" é um livro único, de pouco mais de 100 páginas, de Brandon Sanderson publicado em 2012 e faz parte do mesmo universo de Elantris. A protagonista desta história é Shai.
Shai é um Forjadora, ou seja, pode copiar e recriar perfeitamente qualquer item, reescrevendo sua história com magia. Condenada à morte após tentar roubar o cetro do Imperador, ela tem uma oportunidade de se salvar. Embora sua habilidade como Forjadora seja considerada uma abominação por seus captores, Shai tentará criar uma nova alma para o Imperador, que está quase morto.

É claro que criar (ou recriar, neste caso) uma alma é quase impossível, mesmo se você tiver anos para trabalhar nisso, e Shai certamente não tem anos. Ela tem apenas alguns meses antes que o conselho do Imperador precise apresentá-lo como saudável e caloroso para as outras facções do governo que desejam assumir o controle.
Mas à medida que Shai mergulha nas profundezas da alma do Imperador, auxiliada por um de seus conselheiros, Gaotona, a necessidade de escapar e o desejo de criar uma obra-prima absoluta começam a colidir.

Shai é excessivamente confiante e muito humilde. Alguns de seus princípios morais podem ser distorcidos, mas ela tem um grande coração e uma alma brilhante. O que acho absolutamente revigorante nos livros de Sanderson é que ele nunca se concentra na aparência de seu personagem. Não importa a aparência de uma pessoa – o que importa é como ela se comporta, como se apresenta e quais são suas habilidades e talentos, e o talento de Forjadora de Shai fica muito claro.

Shai cria carimbos, que transcrevem a essência dos objetos e das pessoas. Os princípios mágicos destes carimbos e da Forja ficam um pouco nebulosos em alguns momentos, mas não a ponto de atrapalhar o entendimento sobre o quê Shai está fazendo. 

Como esta é uma história curta, não quero escrever nada que possa dar spoilers. Tudo o que vou dizer é: façam um favor a si mesmos: leiam. Se você não gosta de fantasia - leia. Quem sabe este pode ser o livro que o colocará nisso. E se você é fã de Sanderson, mas ainda não leu este livro, está perdendo algo bem interessante.

Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 3/5

 


Em 2016, viajamos para a Islândia e, deste então, passei a ter curiosidade em ler a literatura deste país. Foi assim que cheguei na ficção especulativa Marcação, de Fríða Ísberg.

Caso você tenha curiosidade, aqui no Perplexidade e Silêncio temos estes posts sobre a Islândia:
EuroTrip: Lugares Literários - Reykjavík, Islândia
Desafio Livros pelo Mundo | Islândia: Moonstone, de Sjón

Na história, a cidade de Reykjavík, capital da Islândia, está dividida por um muro de acrílico. De um lado, aqueles que se submeteram ao teste de marcação; de outro, os que ainda lutam contra o que consideram um mecanismo de polarização e preconceito. A marcação é uma avaliação de empatia criada para prever comportamentos antissociais e, consequentemente, apontar pessoas que podem eventualmente cometer algum tipo de crime. O enredo acontece às vésperas de um plebiscito que decidirá se esse teste de marcação deve se tornar compulsório ou não.

Ao longo de todo o livro, o leitor começa a entender os impactos e as consequências da marcação. Estabelecimentos comerciais, restaurantes, bairros e escolas começam a proibir a entrada de pessoas que não passaram ou não fizeram o teste. Aos poucos, a coisa se complica, e estas pessoas também ficam sem acesso a financiamentos, moradia e emprego. O discurso oficial do governo diz que estas pessoas não devem ser excluídas e, sim, buscar o apoio psicológico gratuito, mas se recusa em endereçar o fato que suas políticas promovem a discriminação e o isolamento.

A história acompanha a vida de alguns personagens e como o teste afeta a vida deles. Amigas de longa data, Tea e Laíla trocam cartas se alfinetando a esse respeito. Ólafur Tandri é um psicólogo influente que sempre desejou fazer do mundo um lugar mais justo. Na escola de um bairro marcado, a professora Vetur enfrenta frequentes crises de ansiedade, mesmo tendo a seu favor uma medida protetiva determinada pela polícia contra o ex-namorado Daníel. Tristan, um rapaz na casa dos vinte anos que faz uso abusivo de substâncias entorpecentes, corre contra o tempo para se livrar do teste e acaba envolvido com o movimento ativista antimarcação.
Os capítulos alternam entre estes personagens. E eu amei que Fríða muda o jeito de escrever em cada capítulo, para que o estilo da escrita esteja condizente com a personalidade do personagem.

Eu fiquei com a sensação que Tristan é o protagonista do livro, uma vez que ele exemplifica toda as consequências do teste na sociedade. Desesperado para conseguir financiar um apartamento antes da obrigatoriedade do teste, ele se envolve com os mais diversos tipos de ilegalidade, uma vez que é única opção restante para os párias da sociedade. Ele também mostra quão ineficiente é a ajuda que o governo dá, desde consultas ridículas com psicólogos até o poder viciante do Trex, "remédio" fornecido pelo governo para curar a falta de empatia.

Sobre a premissa do teste de empatia, achei bastante criativa. Já li inúmeras distopias e ficções especulativas ao longo dos anos e achei uma ideia interessante, ainda que me lembre "Minority Report" em alguns aspectos. Acho que Fríða trouxe uma visão de um futuro muito possível, e esta credibilidade que deixa a leitura boa, porque é algo que podemos imaginar que realmente aconteça em nossa sociedade. Eu adorei o livro e recomendo.

Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 3/5

 
Na resenha de hoje, falarei sobre o segundo volume da série "A Guerra da Papoula", intitulado "A República do Dragão" e escrito por R. F. Kuang.

Para saber o que achei do primeiro volume, veja este post:
Sugestão de Leitura | A Guerra da Papoula, de R. F. Kuang


Após a Terceira Guerra da Papoula, Rin está traumatizada pela atrocidade que cometeu para acabar com a guerra, viciada em ópio e escondendo-se das ordens assassinas do seu deus vingativo, a Fênix. Sua única razão de viver é se vingar da imperatriz que vendeu Nikan aos seus inimigos. Sem outras opções, Rin une forças com o poderoso Lorde do Dragão, que tem um plano para conquistar Nikan, destituir a Imperatriz e criar uma nova República. Rin se joga em sua guerra. Afinal, fazer a guerra é tudo o que ela sabe fazer. Mas a Imperatriz é uma inimiga mais poderosa do que parece, e as motivações do Lorde do Dragão não são tão democráticas quanto parecem.

Um mérito deste volume é que ele é pura ação. Eventos grandiosos e dinâmicos se sucedem ao longo de todo o volume, e poucos são os espaços de respiro para o leitor. Dizer que Rin está com raiva é dizer o mínimo. Ela está com raiva do mundo, de si mesma, dos amigos, de tudo. A guerra mudou ela e seus companheiros, mas eles ainda não conseguem fazer uma pausa; a paz permanece firmemente fora de alcance e perdas inesquecíveis continuam a acontecer. Este é um livro sombrio, escrito com uma prosa mais madura e refinada com maior foco na escuridão e personalidade de Rin.
Rin toma decisões questionáveis. Ela não tem controle de impulsos e faz muitas coisas estúpidas por causa de sua raiva e do que aconteceu com ela. Em seu caminho para superar o legado de Altan, o vício do ópio e aceitar seu poder, Kuang desconstrói a personagem de Rin completamente, apresentando-a no seu pior durante quase toda a primeira metade.
Mas este aprofundamento de personagens não acontece somente com Rin. Há personagens que agora tem narrativas mais complexas, e outros que ficam para trás, para dar espaço ao novo. O arco de Kitay, em particular, é bem interessante. Ele não é mais o garoto alegre do primeiro livro, mas uma versão sobrecarregada e endurecida de si mesmo.

Em termos de enredo, eu fiquei confusa com as batalhas entre a Federação, a imperatriz, os mugeneses, os hesperianos, os nikarianos e todo este lado mais político da história. E, confesso, livros com este tipo de enredo não são meu forte, nem meus favoritos, pois eu logo perco o interesse quando a narrativa fica ao redor de estratégias de guerra e conquista de território. Ainda assim, acredito que Kuang tenha feito um bom trabalho nesta parte, pois mesmo sem entender fiquei entretida no que aconteceria a seguir. As cenas de batalha naval foram as mais entediantes para mim, lado a lado comas discussões sobre poder entre os Lordes.
Inclusive, acho que essa parte do enredo poderia ter sido editada. 650 páginas foi muito, e lá pela página 400 eu estava lendo em Z, querendo saber logo o que aconteceria com Rin e Kitay.

Eu gostei das aparições da Imperatriz, e acho que ela poderia ter mais espaço no próximo volume. Kuang fez um ótimo trabalhando mostrando o porquê dela ser tão poderosa e persuasiva, pois ela não confunde apenas Rin de que é boa, mas também ao próprio leitor. Adorei isso.

Uma coisa realmente boa desta série é a escrita. Kuang é uma escritora brilhante que sabe como transmitir as emoções profundas de seus personagens. Embora tenha elementos que já vi antes, é um enredo original e interessante. Ouvi dizer que o livro final é um dos melhores finalizadores de trilogia que existem, então com certeza continuarei lendo para ver como ela termina.

Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 3/5
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A Escritora

Escritora há 25 anos e psicóloga de formação. Procura os detalhes da vida que passam desapercebidos e as bonitezas que ninguém vê. Faz perguntas incômodas porque gosta de uma boa reflexão. Não caminha pelos lugares-comuns e, quando o faz, faz com convicção. Imagina, sonha e pensa demais. Fala pouco, mas quando fala, por favor preste atenção.

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