Tag Livros - Maio 2022 | Casas Vazias, de Brenda Navarro

 


Tag Livros é um clube de assinatura de livros que eu entrei este ano. A proposta é que você receba na sua casa, todo mês, um livro escolhido por eles e diversos brindes relacionados ao livro. A resenha de hoje será do livro do selo Curadoria de Maio de 2022, "Casas Vazias" de Brenda Navarro.

Caso você queira ver os livros dos outros meses, navegue pelos links abaixo:
Janeiro 2022 | Pesado, de Kiese Laymon
Fevereiro 2022 | Samarcanda, de Amin Maalouf

Brenda Navarro é uma escritora mexicana, socióloga e especialista em Direitos Humanos. Ela é fundadora do projeto Enjambre Literário, que conecta e divulga escritoras e jornalistas latinas, promovendo suas obras e trabalhos. 

Publicado em 2018, "Casas Vazias" é sua obra de estreia. Narrado em primeira pessoa, o livro apresenta a visão de duas mulheres: uma delas perde o filho autista, Daniel, no parquinho, enquanto estava distraída lendo as mensagens do amante no celular; a outra, a mulher que roubou Daniel e o rebatiza de Leonel, que quer ser mãe a qualquer custo. Muitos livros se propõem a narrar em primeira pessoa diversos personagens, alguns escritores não conseguem dar a devida voz e definição aos narradores, mas Brenda não é um desses escritores. Ela traz muita personalidade e identidade nas narrações e, de imediato, sabemos qual das mulheres está contando sua história, e essa sua habilidade de escrita é, sem dúvida, um dos pontos altos deste livro.

Outro mérito das duas narrações paralelas em primeira pessoa é que nós, leitores, sentimos empatia por ambas. A mãe que perde o filho e se questiona se, em um nível inconsciente, não o fez de propósito; a mulher que rouba o filho de outra e não sente nenhum arrependimento. Brenda descreve tão bem as suas perspectivas que é impossível escolher um lado, ficamos do lado das duas, desejando que, de alguma forma, elas tenham algum tipo de final feliz.

A obra ganhou destaque pelo fato de não romantizar a maternidade. A mãe de Daniel mostra uma clara repulsa a Nagore, filha de sua cunhada, que morreu vítima de violência doméstica. Ela despreza Nagore e, quando Daniel nasce, lhe parece impossível ser a fonte de tanto amor materno., sobretudo pensando a respeito das necessidades especiais que Daniel tem. Fala-se abertamente sobre o arrependimento de não ter feito um aborto no início da gestação, sobre depressão pós-parto e sobre a dificuldade em se vincular à nova estrutura familiar. "Não parir, porque depois que nascem, a maternidade é para sempre." 
A segunda mulher narra anos de um relacionamento abusivo, relacionamento este que ela só aguentava por causa da possibilidade de tornar-se mãe. O marido, no entanto, não queria ser pai, e sai de casa quando ela retorna do parquinho com Daniel/Leonel. Ela, então, tenta condensar todo o seu universo e toda a sua felicidade ao redor de uma criança autista de três anos de idade, o que é uma tarefa injusta e fadada à frustração.

Eu fiquei com a sensação de que, apesar do livro ser sobre maternidade, para mim, ele é sobre perdas. De sonhos, identidade, alegria de viver, planos, dignidade, corpo, autonomia, e sobretudo liberdade. Mas é também um livro sobre feminicídio, trauma e culpa. Em cada frase das narrações das duas mulheres, é possível sentir a raiva que permeia todas as decisões que elas tiveram que tomar, e como o dia-a-dia da vida doméstica e dos relacionamentos abusivos as corroeu por dentro, deixando só uma casca do que elas, de fato, eram, e daí o título da obra ser "Casas Vazias", pois é o que elas se tornam. É uma história difícil de ler.

Cuidado com o spoiler, mas o que mais me inquietou foi o final da narrativa. Daniel/Leonel some novamente, e terminamos a leitura sem saber o que foi feito dele. A mãe, já afundada em depressão, parece não mais se importar (nem com ele, nem com nada). A mulher que o rouba entra em desespero, e o ciclo de reinicia, ela sentindo-pensando-fazendo o que a mãe sentiu-pensou-fez no início da narrativa, voltando do parquinho, então assumimos que outra mulher, em outro lugar, está passando pelo que a "sequestradora" passou. Acho que Brenda tenta nos mostrar que a noção de maternidade fica presa neste ciclo venenoso e violento, do qual as mulheres parecem não conseguir sair.

É uma leitura difícil, que recomendo para as mulheres que pensam muito sobre maternidade, seja em forma de sonho ou seja em forma de evitação. Faz a gente pensar.

Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 3/5

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