Já Li #109 - A Curva do Sonho, de Ursula K. Le Guin


O post de hoje falará sobre uma das obras mais intrigantes de Ursula K. Le Guin, entitulado "A Curva do Sonho". Partindo de uma premissa incrível, será que Ursula sustentou a história até o fim? Analisemos.

Caso você queira saber mais sobre a escritora, fiz um post dedicado a ela. É só clicar aqui.

Publicado originalmente em 1971, o livro se passa em Portland (Oregon, Estados Unidos) no ano de 2002. A cultura é praticamente a mesma da década de 1970 nos Estados Unidos, embora empobrecida. Há também uma guerra massiva no Oriente Médio, com o Egito e Israel aliados contra o Irã. O aquecimento global causou estragos na qualidade de vida em todos os lugares do mundo. 
O protagonista é George Orr. Quando George sonha, o sonho literalmente vira realidade. Aliás, aqui faço um adendo: não só vira realidade como transforma a realidade do mundo. Por exemplo: se George sonha que um prédio não existe, assim que ele acorda o prédio não está mais lá, e ninguém sequer se lembra que o prédio um dia existiu. Assim, não é difícil entender que George evita ao máximo sonhar e acaba ficando viciado em diversos tipos de droga. Por causa do vício, George é obrigado a fazer terapia de desintoxicação com um psiquiatra chamado William Haber que lhe explica que é humanamente impossível ficarmos sem sonhar, pois o sonho faz parte de um processo cerebral indispensável à vida.

Até este ponto da leitura, eu estava muito interessada. A premissa criada por Le Guin é muito interessante e me peguei pensando em todos os sonhos que já tive e que bizarro seria o mundo se eles o transformassem. Também estava curiosa para ver qual seria a reação de Haber quando descobrisse do que George era capaz.
Haber, então, procura usar o poder de George para mudar o mundo. Suas experiências com uma máquina de biofeedback/EEG, apelidada de Amplificador, aprimoram as habilidades de George e produzem uma série de mundos alternativos cada vez mais intoleráveis, com base em uma variedade de premissas utópicas (e distópicas).
Quando Haber instrui George a sonhar com um mundo sem racismo, a pele de todos no planeta se torna um cinza claro uniforme. Uma tentativa de resolver o problema da superpopulação se mostra desastrosa quando George sonha com uma praga devastadora que destrói grande parte da humanidade e dá ao mundo atual uma população de um bilhão em vez de sete bilhões. George tenta sonhar com a existência de "paz na Terra", resultando em uma invasão alienígena da Lua que une todas as nações da Terra contra a ameaça.

Um dos meus problemas com este livro foi a personagem de Haber. Cada vez que ele aparecia em cena, eu revirava os olhos, pois os diálogos com ele eram extremamente maçantes. Haber só sabia falar das tecnicidades dos sonhos e do Amplificador, e eu me sentia lendo um parágrafo de TCC. Achei um erro feio de Le Guin, que dificultou muito a fluidez da leitura e, pior ainda, o desenvolvimento de um vínculo com Haber. Embora ele tenha boas intenções quando manipula os sonhos de George, Haber é tão chato e tão entediante que faz toda a dinâmica se perder. Ele poderia ter sido um anti-herói incrível, mas não foi.
O que se conecta com meu outro problema do livro, que é o próprio George. Ele é muito insosso. No começo da narrativa, ele deve ser insosso, então até aí tudo bem, mas em algum momento da história ele deveria evoluir. Mas esse momento demora tanto a chegar - tanto! - que, quando chega, quase no final do livro, eu já não queria mais saber do herói. 
Assim, consequentemente, passei quase toda a leitura resmugando, porque não aguentava mais a dinâmica entre os dois chatos, Haber e George. E, para piorar, a cadência do enredo é muito lenta e eu quase desisti da leitura algumas vezes.

Há também o interesse amoroso de George, Heather, mas o relacionamento deles me pareceu um elemento forçado. Não me convenceu nem me cativou.

O legal mesmo deste livro é acompanhar as mudanças de realidade e as consequências no mundo e na sociedade. Achei um exercício de imaginação muito interessante e foi nisso que Le Guin me ganhou. Mesmo quando os alienígenas são introduzidos à realidade da Terra pareceu uma realidade possível e natural e, se o livro tivesse explorado mais (e melhor) estas especulações, teria completado seu potencial de obra-prima.
Por causa disso, é uma leitura que recomendo, apesar dos pontos negativos que identifiquei nesta resenha. 

Prefiro outras obras de Le Guin. Se você quiser se inteirar em seus outros livros, navegue pelos links abaixo:

Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 

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