A resenha de hoje é sobre uma história de suspense a respeito do relacionamento conturbado entre um serial killer e uma de suas vítimas. Falaremos de "A Inquilina Silenciosa", de Clémence Michallon.
Publicado em 2023, "A Inquilina Silenciosa" tem várias narradoras. Em alguns capítulos, em primeira pessoa, temos o ponto-de-vista de Emily, que aos poucos está se envolvendo emocionalmente com Aidan, o mais recente viúvo da cidade (e o serial killer da história). Em menor quantidade, há os capítulos narrados por Cecília, também em primeira pessoa, a filha de treze anos de idade de Aidan, que tenta lidar com a perda recente da mãe e a inadequação social enquanto adolescente em uma escola nova.
Além delas, há também pedaços curtinhos narrados pelas vítimas de Aidan, seus pensamentos e sentimentos antes de serem assassinadas por ele (ao todo, são nove vítimas).
Além delas, há também pedaços curtinhos narrados pelas vítimas de Aidan, seus pensamentos e sentimentos antes de serem assassinadas por ele (ao todo, são nove vítimas).
Mas a narradora principal é uma das vítimas de Aidan - cujo nome somente descobrimos no último capítulo - e que, para efeitos de clareza nesta resenha, a chamarei de Inquilina. As partes da Inquilina são narradas em segunda pessoa, o que é um recurso técnico bastante raro que só vi duas vezes em toda a minha vida (neste livro de N. K. Jemesin e neste conto da mesma autora). Achei ousado, e Clémence ganhou pontos comigo por isso.
A Inquilina está sendo mantida refém há cinco anos quando a história inicia, em um galpão dentro da propriedade de Aidan. A rotina dela no galpão me lembrou muito "A Estranha Sally Diamond", de Liz Nugent. Quando a similaridade de narrativas estava começando a me incomodar, Michallon move a história adiante, com a mudança de cidade de Aidan após a morte de sua esposa. Ele decide levar a Inquilina consigo, e toma uma decisão inusitada: como a nova casa não tem um galpão, a Inquilina deverá ficar trancada no quatro o tempo todo, algemada ao aquecedor, e só poderá sair quando Aidan permitir, para interações curtas com Cecília, de forma que a garotinha não estranhe completamente a presença da Inquilina no outro quarto.
Aqui preciso dizer que achei essa escolha narrativa pouco criativa, pois me parece bastante improvável que Aidan tomaria uma decisão como esta, mas aceitamos e seguimos.
Aqui preciso dizer que achei essa escolha narrativa pouco criativa, pois me parece bastante improvável que Aidan tomaria uma decisão como esta, mas aceitamos e seguimos.
Aidan é visto como um "homem de bem" na cidade, todos gostam dele e chegam ao ponto de organizarem ações para arrecadar dinheiro para ele e sua filha. Ele se vale dessa reputação para se aproximar de Emily, a bartender do bar local (sim, é uma daquelas cidades onde todo mundo se conhece, e onde só existe um restaurante, um bar, uma farmácia, uma padaria, etc). Emily é chatíssima, super grudenta em Aidan, muito carente e vulnerável, e acredito que Michallon a escreveu assim de propósito, pois Emily tem uma personalidade bem diferente da Inquilina. Emily e Aidan começam um relacionamento, e acredito que fique claro para o leitor, desde o início, que Aidan a está marcando como sua futura vítima.
O suspense do livro é sabermos quando (e se) a Inquilina conseguirá escapar de Aidan, pois ela perde algumas oportunidades de fuga ao longo do enredo, algumas por opção própria. O mistério que paira no ar é se a Inquilina ainda acredita que possa reconstruir sua vida "do lado de fora", uma vez que chega ao ponto de esquecer seu próprio nome. Porém, achei que o suspense não foi muito bem construído porque, por algum motivo, não senti medo de Aidan em nenhum momento, nem mesmo quando ele ameaçava a Inquilina.
Acredito que Michallon tentou construí-lo assim de propósito, mas acho que ela errou o tom e passou do ponto, pois ele ficou bonzinho demais. Um pouco mais de crueldade, ou de violência, teria deixado a história mais misteriosa e menos entediante em alguns momentos.
Também entendo a escolha de Michallon de contar a história do ponto-de-vista das vítimas, que realmente tornaria o enredo mais original, mas aqui também acho que ela errou o tom, principalmente de Emily. Por exemplo, acho que ela deveria ter complicado mais a personalidade da Inquilina, deixando-a mais transtornada, mais desconectada da realidade, ou até mesmo apaixonada por Aidan e com ciúmes de Emily, pois foi difícil me conectar com uma personagem que não tem identidade por quase todo o livro.
E, por fim, o desfecho do enredo me pareceu meio bobo. De todo um universo de possibilidades que poderia acontecer com Aidan, com a Inquilina, com Emily, sinto que Michallon escolheu o caminho mais óbvio e mais sem graça. Parece que ela teve medo de escolher caminhos mais obscuros ou polêmicos - como Raphael Montes faz em "Dias Perfeitos", por exemplo - e optou pelo mais seguro de todos. Entediante.
Concluindo: não é um livro ruim, mas com certeza irá frustrar os fãs de suspense.
Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 2/5
O suspense do livro é sabermos quando (e se) a Inquilina conseguirá escapar de Aidan, pois ela perde algumas oportunidades de fuga ao longo do enredo, algumas por opção própria. O mistério que paira no ar é se a Inquilina ainda acredita que possa reconstruir sua vida "do lado de fora", uma vez que chega ao ponto de esquecer seu próprio nome. Porém, achei que o suspense não foi muito bem construído porque, por algum motivo, não senti medo de Aidan em nenhum momento, nem mesmo quando ele ameaçava a Inquilina.
Acredito que Michallon tentou construí-lo assim de propósito, mas acho que ela errou o tom e passou do ponto, pois ele ficou bonzinho demais. Um pouco mais de crueldade, ou de violência, teria deixado a história mais misteriosa e menos entediante em alguns momentos.
Também entendo a escolha de Michallon de contar a história do ponto-de-vista das vítimas, que realmente tornaria o enredo mais original, mas aqui também acho que ela errou o tom, principalmente de Emily. Por exemplo, acho que ela deveria ter complicado mais a personalidade da Inquilina, deixando-a mais transtornada, mais desconectada da realidade, ou até mesmo apaixonada por Aidan e com ciúmes de Emily, pois foi difícil me conectar com uma personagem que não tem identidade por quase todo o livro.
E, por fim, o desfecho do enredo me pareceu meio bobo. De todo um universo de possibilidades que poderia acontecer com Aidan, com a Inquilina, com Emily, sinto que Michallon escolheu o caminho mais óbvio e mais sem graça. Parece que ela teve medo de escolher caminhos mais obscuros ou polêmicos - como Raphael Montes faz em "Dias Perfeitos", por exemplo - e optou pelo mais seguro de todos. Entediante.
Concluindo: não é um livro ruim, mas com certeza irá frustrar os fãs de suspense.
Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 2/5
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