Já Li #186 - Dias Perfeitos, de Raphael Montes

 

Este é um livro forte, sem dúvida não recomendado para menores de dezoito anos, e com um conteúdo carregado de violência. "Dias Perfeitos", de Raphael Montes, é para quem tem estômago forte.

Eu preciso dizer que a sinopse deste livro me indigna muito. Há uma menção a "história de amor". Não. Não é. É a história de um psicopata que abusa, de maneiras impensáveis, uma mulher pela qual fica obcecado após uma conversa de cinco minutos em uma festa. Este livro foi publicado em 2014, e muito se avançou nas discussões sobre o tema nestes últimos dez anos, mas ainda assim me revolta muito - muito! - que os editores não atualizaram a sinopse para algo mais responsável. 
Desabafo à parte, o livro tem como protagonista Téo, um rapaz carioca estudante de Medicina. Sua única amiga é Gertrudes, um cadáver que estuda na faculdade, e "a única pessoa em quem confia". Sua mãe, cadeirante, se apresenta como um peso em sua vida, que o obriga a fingir as emoções humanas normais, como amor, carinho e saudade. Em uma festa que ele vai obrigado pela mãe, ele conhece Clarice, por quem fica imediatamente obcecado.

Ele a persegue e a sequestra, tornando-a refém em uma pousada e depois arrastando-a para uma praia deserta. Daí em diante, saiba que esta é uma história sobre um psicopata. Há assassinatos, tortura, manipulação emocional, e atos inimagináveis. "Dias Perfeitos" me perturbou como só "O Psicopata Americano, de Bret Easton Ellis" conseguiu, com a diferença que eu consegui terminar a leitura de Montes por causa do contrapeso de Clarice.  

Clarice, para mim, é uma personagem meio Capitu. A história não é contada no seu ponto-de-vista, então cabe ao leitor interpretar. Minha interpretação foi que Clarice finge estar apaixonada por Téo e finge ter conexão com ele, para desarmá-lo e encontrar brechas para fugir. E, de fato, em diversos momentos, esta tática dela funciona, mas infelizmente não há um final feliz. Além disso, nós, leitores, só sabemos como Clarice está através do olhar de Téo, que obviamente é deturpado e doente. Por isso, precisamos nos ater a pequenas dicas que Montes nos dá sobre o real estado de Clarice, e por estas dicas percebemos que ela está enlouquecendo. 
Sua personalidade foi o que me manteve entretida na história, porque só me importava saber o que ela faria a seguir, se ela conseguiria escapar de Téo, e até mesmo se sua família seria capaz de rastrear os eventos e resgatá-la. E Montes faz um trabalho de suspense excelente porque, em um dado momento, o leitor percebe que a morte não é a pior coisa que pode acontecer a ela, e você passa a se perguntar o que seria, então. E Montes imagina algo tão tão tão perturbador que eu não sei nem como resenhar, para ser sincera.

A respeito da parte técnica, meu comentário é sobre a parte final do livro. Eu não gostei muito da mudança de ritmo entre os primeiros 3/4 do enredo e o 1/4 final. Durante quase todo o livro, há um ritmo estabelecido por Montes onde estamos sempre no momento presente, ou seja, o tempo narrado é no agora, e não no futuro, e os saltos de tempo são quase inexistentes (talvez só saltos de algumas horas). Contudo, no final, Montes salta anos, muitos anos, e achei esquisito. Eu preferia que ele tivesse feito um salto apenas, em um epílogo, mostrando um dia na vida dele e de Clarice, no mesmo estilo de "tempo presente". 

De maneira geral, é um livro muito bom. Me causou exatamente o que deveria causar, e me deixou entretida mesmo com o estômago embrulhado. Assim, é uma leitura que recomendo.
Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 3/5

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