Já Li #201 - Olho no Céu, de Philip K. Dick

 

Na resenha de hoje, retornamos às histórias clássicas de ficção-científica, e o livro escolhido da vez é "Olho no Céu", de Philip K. Dick.
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Originalmente publicado em 1957, as premissas desta história ainda são passíveis de debate até hoje, sobretudo no que é relacionado a política e polarização.

Enquanto passeava no Belmont Bevatron, um laboratório de Ciência Avançada, Jack Hamilton, junto com outras sete pessoas (incluindo sua esposa), sofre um acidente. O acidente ocorre depois que ele descobre que sua esposa, Marsha, está sendo investigada como comunista, e ele é demitido por causa disso, uma vez que o Bevatron trabalha para o governo americano e não pode "se expor a este risco de segurança".
Quando Hamilton recupera a consciência após o acidente, ele acorda em um mundo baseado nos princípios morais do Antigo Testamento, um lugar de pragas instantâneas, condenações imediatas e morte para todos os infiéis. Hamilton descobre como ele e as outras sete pessoas podem escapar deste mundo e regressar ao mundo real. Mas, primeiro, eles passarão por outros três outros mundos, cada um mais perigoso do que o anterior.
Estes mundos são construídos a partir das mentes das pessoas acidentadas. A explicação é que a radiação emitida pelo acidente os conecta de alguma maneira, e eles são capazes de "passear" pelos pensamentos uns dos outros. 

Dick tornou realidade o sonho de um fundamentalista religioso, uma sociedade unida pela fé nas suas crenças rígidas, na qual a ciência e a religião se fundem na busca do canal mais eficiente de comunicação com Deus. O próprio Sistema Solar é bíblico onde a Terra é o centro do cosmos e fica sobre um vasto campo de mineração chamado Inferno. Somos monitorados de cima por um olho enorme, que tem muito pouca visão da condição humana, e somente responde à subserviência humana.
Ninguém trabalha por salários, mas por créditos de salvação que são determinados pela posição da pessoa na sociedade. O próprio Deus prega aos domingos através de uma rede de televisão. O racismo e o militarismo são obrigatórios.

Mas este é apenas um dos mundos de fantasia contidos em "Olho no Céu". Existe um modelo distinto para cada uma das vítimas do acidente e cada um tem sua própria visão da realidade e dos costumes adequados aos quais os seres humanos deveriam aderir. 
Há, por exemplo, o mundo da Sra. Edith Pritchett, que elimina todas as doenças, dores e inconveniências. O que aparenta ser um ótimo lugar para eles se estabelecerem, logo se torna outro pesadelo, uma vez que a subjetividade do que incomoda Edith logo se torna absurda e aleatória. 
O terceiro mundo é de Joan Reiss, uma mulher ansiosa e paranoica que vê terríveis ameaças em tudo e em todos, o que colabora para que sua dimensão seja aterrorizante.

Dick tem uma ideia interessante para uma hipótese de mundos múltiplos baseada na teoria quântica (formulada pela primeira vez pelo físico Hugh Everett em 1957, no mesmo ano em que Dick publicou a sua história. Quem inspirou quem?). A sugestão de Dick é que a possibilidade de mundos paralelos se baseia numa experiência inteiramente subjetiva que pode ser projetada na consciência de outros. 
Eu preferiria se Dick tivesse elaborado e desenvolvido mais a ideia do mundo do Antigo Testamento, que vem da mente do idoso veterano Arthur Sylvester. Achei que esta parte da narrativa tinha mais potencial e poderia ser trazido com maior profundidade.

Só não gostei mais do livro porque não gosto muito do estilo de escrita de Dick, e isso vale para todas as obras deles que já li. As ideias são excelentes, o peso que ele tem para o mundo da ficção-científica é indiscutível, mas, a mim, falta alguma coisa. Já sei o quê - falta carisma, nos personagens e no ritmo que o próprio Dick impõe ao enredo. Mas, ainda assim, é uma leitura que recomendo.
Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 3/5

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