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"Colchão de Pedra", publicado em 2014, é uma coletânea com nove contos que tem como fio condutor a velhice, tão pouco representada na cultura pop/literária que consumimos. Alguns contos estão conectados através de personagens, e outros são histórias são completamente independentes.
De maneira geral, as personagens estão passando por algum tipo de reflexão no fim de suas vidas, e estão se aproximando da decadência e da morte, em maior ou menor medida dependendo da história. Enquanto traz esta perspectiva, Atwood adiciona tramas interessantes e originais, como ela sabe fazer muito bem, o que prendeu minha atenção do começo ao fim.
Os dois primeiros contos, Alphinland e Aparição, estão conectados. Em Alphinland, Constance acaba de ficar viúva e luta para se manter aquecida e alimentada em meio à pior tempestade de neve de todos os tempos. Constance alcançou fama e popularidade com sua série de fantasia Alphinland, mas não consegue ver valor nelas agora que atingiu a velhice. Na solidão, ela relembra seus relacionamentos anteriores, o que a faz pensar em Gavin, um namorado abusivo que teve nos anos 60. Já em Aparição, Gavin é o protagonista, e sabemos que ele ganhou uma certa notoriedade com seus poemas, e agora está casado com uma mulher controladora que se aproveita de seu desinteresse pela vida. Gavin, no final da vida, lembra de Constance e se pergunta se deveria ter continuado com ela.
Gostei de Lusus Naturae, que conta a história de uma menina que é lobisomem e, para fugir do preconceito da cidade pequena onde vive, se finge de morta, com direito a funeral e caixão sepultado. É narrado em primeira pessoa e tem uma atmosfera Lygia Fagundes Telles que eu adorei. Também gostei de A Mão do Morto te Ama, que tem essa mesma energia Lygia, sobre um escritor que se funde com sua própria história.
O conto que dá título ao livro, Colchão de Pedra, é um caso de assassinato na Antártida, assassinato este cometido por uma mulher idosa que reencontra uma desavença dos tempos da juventude.
Lendo este livro, a sensação que eu tive foi de que Atwood se divertiu experimentando novos enredos. E, por mais que ela tenha tentado se distanciar das distopias pelas quais é conhecida, ainda podemos ver sua imaginação e incrível capacidade de worldbuilding, sobretudo no último conto, Fogo na Poeira. Neste conto, existe um movimento da sociedade em exterminar idosos, sob o pretexto de que eles não oferecem mais contribuições para a economia, e incendeiam asilos. A protagonista deste conto, Wilma, tem deficiência visual e acompanha o desenrolar dos acontecimentos através dos outros.
Atwood sempre me surpreende com seu brilhantismo e originalidade. Os contos são sombrios e engraçados, mas sempre afiados em suas observações sobre as indignidades do envelhecimento. Não consigo esconder minha admiração por uma escritora que combina uma imaginação tão vívida com uma execução tão brilhante. Eu sei que nem todo mundo gosta da forma de conto; se você gosta de contos, deve a si mesmo ler esta coleção impressionante.
Definitivamente uma leitura que recomendo, como tudo de Atwood.
Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 4/5
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