Já Li #165 - Remote Control, de Nnedi Okorafor

 

Remote Control é o livro mais recente da escritora nigeriana Nnedi Okorafor. Misto de fantasia com um pouco de ficção-científica, a obra também traz ideias presentes no folclore de seu país de origem. No post de hoje, iremos discutir sobre os erros e acertos desta mistura.

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Publicado em 2021, "Remote Control" conta a história de Sankofa, uma menina de quatorze anos que distribui morte por onde passa - literalmente. Ela tenta descobrir o que aconteceu com ela e, aos poucos, conforme perambula por Gana, pedaços de seu passado voltam à sua memória, embora ela ainda não se lembre de seu verdadeiro nome. Todas as pessoas sabem quem ela é e a esperam com roupas limpas, Fanta laranja e uma mesa farta de comida. A grande maioria delas não gosta de sua visita, mas há quem veja a morte como um alívio para a dor e para o desespero. Sankofa emite uma luz verde quando está prestes a trazer a morte e, até o momento, ainda não é capaz de controlar a extensão desta luz, e frequentemente mata pessoas sem querer.

Alguns capítulos do livro são flashbacks que mostram a origem de Sankofa. Fátima era uma menina que gostava de ficar no alto de uma árvore de karité, olhando as estrelas. Fátima sempre dizia que conseguia escutar o que as estrelas lhe diziam, e deixava mensagens escritas no chão de terra, "as letras das estrelas", que eram como imagens abstratas de constelações. Seus pais não entendiam o que Fátima queria dizer, tampouco seu irmão mais novo, mas a deixavam em paz no quintal. Um dia, caiu uma chuva de meteoros, e no meio dessa chuva Fátima encontrou uma estranha semente verde, que emanava uma luz fraquinha. Pressentindo a importância dessa semente, Fátima a esconde.

Uma empresa multinacional (chamada LifeGen - vejam que irônico) tenta roubar a semente, pois eles sabem do enorme poder que ela encerra. Ao tentar evitar que isso aconteça, Fátima absorve a luz verde, desmaia e, quando acorda, a cidade inteira está morta - menos ela e uma raposa. Ela já não se lembra do seu próprio nome e, inspirada por um pássaro de madeira de seu irmão, se autodenomina Sankofa. Aterrorizada por ter matado toda sua família, além de todo o resto da cidade, Sankofa foge, sem saber para onde, devastada pelo luto.

O aspecto que mais gostei desse livro é que, no mundo de Okorafor, Sankofa caminha na fronteira entre a vida moderna e os contos populares, a interação entre orgânico e tecnológico. Este é o lugar onde drones, carros autônomos, hashtags e “jelli-telli” coexistem com religião, lendas super antigas,  cabanas de barro e fazendas de árvores de karité. Há robôs e também raposas, aldeias rurais e enormes conglomerados multinacionais. Ao mesmo tempo que a história parece estar no futuro, em um mundo distópico, há vários momentos que o leitor é transportado ao passado, e essa mistura torna a leitura muito interessante. Nesse ponto, acho que Okorafor fez um trabalho de desenvolvimento de cenário muito melhor do que em "Quem Teme a Morte", e fiquei satisfeita.

É legal também ver como a lenda de Sankofa muda depedendo do vilarejo onde ela está, e como as pessoas foram distorcendo os fatos até o ponto de acreditarem que ela é uma extraterrestre. Sankofa acha graça dessas versões de si mesma que existem por Gana, e constantemente se pergunta o que ela é. Aparentemente, além de matar tudo ao seu redor, a menina também não envelhece e, aparentemente, é incapaz de morrer, mas nem a própria Sankofa sabe quem é.

Eu gostaria muito que Okorafor continuasse a história. No final, ela dá a entender que existem outras sementes com o mesmo poder, espalhadas pelo antigo quintal de Sankofa/Fátima, e que a tal empresa multinacional já as encontrou. A reflexão sobre o que o ser humano seria capaz de fazer com tal poder é muito interessante e poderia ser explorada em mais detalhes. Não sei se Okorafor pretende escrever um segundo volume mas, mesmo que não o faça, o livro é muito bom e eu recomendo a leitura.

Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 3/5

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