Já Li #84 - Quem Teme a Morte, de Nnedi Okorafor


O livro do post de hoje, "Quem Teme a Morte" da nigeriana Nnedi Okorafor, promete uma distopia africana misturada com magia. Mas será que ele cumpre essa promessa?

Nnedi Okorafor vem de uma família igbo, ou seja, originária do sudoeste da Nigéria. Ela nasceu nos Estados Unidos quando seus pais não puderam retornar ao país por causa da Guerra Civil, quando os igbos quiseram independência do restante do país. Desde criança, Nnedi gostava de ciências e já na escola começou a escrever contos de ficção-científica. 

"Quem Teme a Morte", publicado em 2010, é o primeiro romance adulto de Nnedi, que até então só tinha escrito para o público infantojuvenil. Na teoria, o livro se passa numa África pós-apocalíptica, onde um povo chamado Nuru escraviza os Okeke. Os Nuru são pessoas de pele clara enquanto os Okeke são pessoas de pele escura.

No entanto, ao longo da leitura, não consegui perceber nenhum elemento pós-apocalíptico ou distópico na narrativa, o que me frustrou consideravelmente. Nnedi inseriu apenas rápidas menções a computadores e celulares, que constrataram com o cenário rústico de deserto com suas tendas e costumes tradicionais. A princípio, achei que eu tinha entendido errado em qual tempo a estória se passava, pois fiquei confusa se era no passado ou no presente, mas em nenhum momento consegui apreender que se tratava de um futuro pós-apocalíptico. Por causa disso, eu quase desisti da leitura, mas persisti.

A protagonista é Onyesonwu, que significa "quem teme a morte" em igbo. Sua mãe, uma sacerdotisa Okeke, foi estuprada por um conquistador Nuru, dando origem a Onye, que é considerada uma Ewu, ou seja, a mistura entre Okeke e Nuru. Os Ewus são considerados seres malignos, pois são nascidos do ódio e da violência e, por isso, amaldiçoados e abandonados por todos seus amigos e familiares. A mãe de Onye é banida da aldeia porque é considerada culpada pelo seu próprio estupro e, assim, mãe e filha passam mais de seis anos no deserto, até chegarem a uma aldeia. Lá, a mãe de Onye consegue reconstruir sua vida e casa com Fadil, um gentil ferreiro.

Conforme vai crescendo, Onye descobre que possui alguns poderes mágicos. Ela pode, por exemplo, devolver a vida aos mortos, assim como também consegue se transformar em animais. Onye acaba chamando a atenção de Mwita, um garoto também Ewu, que estuda para ser feiticeiro com Aro, o mago da aldeia.

Onye sente que seu pai, o estuprador de sua mãe, a vigia e a procura, querendo matá-la. Com medo de que ele a alcance na aldeia e mate todos ali, ela sai em busca dele, em direção ao Oeste.

O livro aborda dois temas pesados: o estupro, abuso sexual e a castração feminina.
Nnedi Okorafur teve como referência um artigo chamado "We Want to Make a Light Baby", escrito em 2004 por Emily Wax, que conta a história real dos estupros cometidos no conflito de Darfur. Esse conflito aconteceu no Sudão e as mulheres eram estupradas na frente de seus maridos e filhos, com o objetivo de humilhar toda a família e o povo. Nnedi não poupa o leitor na cena de estupro da mãe de Onye, é de embrulhar o estômago, ainda mais quando sabemos que é algo baseado em fatos reais.
Uma das amigas de Onye, Binti, sofre abusos sexuais de seu pai desde que é criança. Embora o assunto seja tratado em segundo plano, pois Binti é uma coadjuvante que aparece pouco, ainda assim é difícil de ler.
E referente à castração feminina, trata-se de uma prática comum na África. Ao completarem onze anos, as meninas tem seu clitóris retirado, pois a crença popular diz que a mulher não deve ceder e não merece os prazeres sexuais. No livro, quando Onye é castrada, ela perde seus poderes mágicos. Suas amigas, também castradas, pedem que ela dê um jeito de reparar o clitóris, pois elas querem sim ter prazer sexual.
A forma como Nnedi aborda estes temas é interessante. A personalidade de Onye e de suas amigas é bastante cativante e, mesmo diante de assuntos tão pesados, elas os abordam com força e graça.

Mas, excetuando estes temas, achei este livro chato. Além da questão do pouco desenvolvimento da trama distópica que comentei acima, a trama envolvendo a busca de Onye por seu pai não me cativou. Ela sai para o deserto com Mwita e suas amigas e a dinâmica do grupo não prendeu minha atenção. E mesmo as descobertas mágicas de Onye pareceram muito fáceis, até descabidas em alguns momentos. Por isso, infelizmente, não é um livro que recomendo.

Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 

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