O livro ou o filme? | Desobediência, de Naomi Alderman


O post de hoje fala do amor proibido entre duas mulheres, Ronit e Esti, no contexto do Judaísmo. O livro, "Desobediência" de Naomi Alderman, foi adaptado para os cinemas ano passado com as incríveis Rachel Weisz e Rachel Adams como protagonistas.

"Desobediência", publicado em 2006, conta a estória de Ronit. Filha de um rabino judeu, ela precisa retornar à sua cidade natal, Hedon, para o funeral de seu pai. Ronit mudou-se para Nova Iorque e está muito distante dos preceitos do Judaísmo, desde as roupas que usa até o fato de ser amante de seu chefe. Ao chegar em Hedon, Ronit se vê diante da obrigação de lidar com pessoas de seu passado, sobretudo Dovid e Esti, seus melhores amigos da infância até a adolescência.

Em paralelo, há a estória de Dovid, cotado para ser o sucessor do rabino após sua morte. Ele sofre de graves enxaquecas mas sua religião não permite que ele vá ao médico descobrir o que tem. Além disso, ele é apático. Dovid não quer ser o próximo rabino mas não tem coragem de contestar a comunidade judaica. Ele é casado com Esti, uma professora tão apática quanto ele, que segue o Judaísmo de forma ortodoxa. Ao longo da leitura, começamos a perceber que Esti e Ronit tem um passado amoroso, soterrado por anos e anos de amargura, silêncio e sensação de culpa de ambos os lados.

O filme, lançado em 2018, conta com Rachel Weisz como Ronit e Rachel Adams (irreconhecível) como Esti. 
Logo no início do filme, a primeira diferença de Ronit é que ela surge como uma fotógrafa que faz sexo com estranhos em banheiros públicos. O roteiro deixa de lado toda a contextualização de Ronit como uma alta executiva de Nova Iorque, bem como seu caso extraconjugal com um colega de trabalho. Achei que esta mudança de background de Ronit impactou negativamente a construção da personagem no filme. 

Além disso, há uma mudança no tom da personagem de Esti. No filme, ela aparece um pouco mais "desaforada" e menos apática do que no romance de Naomi Alderman. Por um lado, isso é bom para o ritmo do filme, que fica mais animado. Por outro lado, contradiz a intenção de Alderman, que queria mostrar como a feminilidade, as emoções e as decisões de Esti eram sufocadas pela religião e pela comunidade. 
O livro é narrado dos pontos-de-vista de Dovid e Ronit, mas no filme Dovid é mais como um coadjuvante da trama e Esti ganha mais destaque.

O livro ou o filme? O livro.
Achei que o filme desvirtuou muito as personagens. Entendo o apelo que isso tem, mas não concordo com a mudança.
Por exemplo: No filme, um dos momentos mais íntimos entre Ronit e Esti é visto e contado sob o ponto-de-vista de Dovid, o que faz toda a diferença na profundidade e na emoção da cena. E, ao contrário do que é mostrado no filme, Dovid aceita o amor entre as duas mulheres.
Há várias cenas que mostram uma grande e crescente intimidade entre Ronit e Esti, o que não acontece no livro, e Esti jamais fumaria um cigarro. Quando vi essa cena me revoltei, porque não tem nada a ver com a essência da personagem interpretada por Adams.
Se não quiser ler spoilers, sugiro pular este parágrafo. E, para completar, o final é diferente. No livro, Esti segue apagada e se conforma que está grávida de Dovid, soterrando de vez os sentimentos por Ronit. No filme, ela briga e luta para ficar com ela, o que não condiz com a trama elaborada por Alderman.

Assim, se eu tivesse que escolher entre um ou outro, escolheria o livro.

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