Um dos nomes mais conhecidos da ficção-científica moderna é John Scalzi e, no post de hoje, falaremos sobre seu livro "Encarcerados".
John Scalzi já foi o presidente da associação Science Fiction and Fantasy Writers of America (SFWA), que conta com cerca de dois mil escritores destes gêneros, vindos do mundo todo, e que tem voto obrigatório nos prêmios Nebula e Hugo. Scalzi saiu de seu posto em 2015, quando decidiu se concentrar mais em sua carreira de escritor.
"Encarcerados" foi publicado em 2014 e mistura ficção-científica com suspense/crime. A premissa da obra é que um vírus se espalhou pela Terra e apenas 1% da população sofreu o encarceramento, ou seja, a perda completa dos movimentos do corpo mas a manutenção da consciência e das funções cognitivas. Com isso, esta parcela da população ficou - literalmente - encarcerada dentro de um corpo, mas totalmente consciente do ambiente ao seu redor. Para prover um mínimo de qualidade de vida para estas pessoas, criaram-se as C3, que são máquinas conectadas aos cérebros dos encarcerados e comandadas por eles, à distância.
Os portadores desta doença são conhecidos como Haden.
A estória se passa 25 anos depois deste evento com o vírus e o protagonista é Chris Shane. Ele fez parte da primeira onda do vírus e o contraiu quando ainda era uma criança, o que o transformou, automaticamente, numa ferramenta de propaganda do governo para que o restante da população não maltratasse os Haden e compreendessem que eles continuavam sendo pessoas atrás de seus C3. Agora agente do FBI, Shane luta para ter sua identidade desvinculada destas propagandas do governo e, também, da figura do seu pai, que concorre ao Senado.
Logo em seu primeiro dia de trabalho, Shane vai contra uma enorme greve dos Haden, que protestam contra uma nova lei que lhe tirará uma série de direitos. Mal visto pelos outros encarcerados, ele passa a ser parceiro de Leslie Vann e, juntos, eles precisam desvendar um crime. Um integrador foi assassinado num quarto de hotel e ninguém sabe por quem ou por quê. Integradores são pessoas treinadas para receber a consciência dos encarcerados em seus corpos, ao invés de terem suas mentes conectadas numa máquina C3.
As implicações das premissas de ficção-científica de Scalzi são interessantes. Por exemplo: é impossível matar um encarcerado através de seu C3, afinal, este último é apenas uma máquina; assim, atacar um C3 é apenas "dano à propriedade privada" mesmo que, intencionalmente, tenha havido uma tentativa de assassinato daquela mente que estava ali dentro. Além disso, os integradores são considerados especiais, pois poucas são as pessoas que aguentam uma segunda consciência habitando seu corpo.
Shane e Vann começam a investigar o assassinato no quarto do hotel e, aos poucos, percebem que o crime está atrelado à nova lei aprovada pelo governo. Até então, todos acreditavam que seria impossível um integrador ser dominado completamente por um encarcerado, mas várias pistas levam os dois agentes do FBI a acreditar que isso pode sim acontecer. Eles contam com a ajuda de um room mate de Shane, que faz programação de códigos nos C3.
Porém, acho que Scalzi pecou na parte de suspense/crime do enredo. O background de cyberpunk ficou arrastado e repetitivo, com diálogos chatos e cansativos entre Shane e o room mate. Foram muitas páginas de explicações sobre códigos de programação, bugs, circuitos e placas e, num dado momento da leitura, comecei a perder o interesse pela trama.
Além disso, o livro se vale, praticamente, apenas de diálogos para caminhar com o enredo. Shane é ótimo - muito bem escrito e extremamente carismático - mas as demais personagens não. Elas parecem todas mais ou menos iguais e, consequentemente, o tom dos diálogos permanece o mesmo. Se não fosse por Shane, eu teria desistido do livro na metade.
Por fim, o desenvolvimento do crime em si não me surpreendeu. O final do mistério não foi muito interessante e o suspense do livro todo agiu como um anti-clímax.
Assim, o que salva este livro é seu bom embasamento de ficção-científica e as idéias originais de Scalzi para uma sociedade do futuro. No entanto, não é uma leitura que eu recomendo.
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