12GLCGM | A História Secreta da Mulher Maravilha, de Jill Lepore


O Desafio 12 Grandes Livros com Grandes Mulheres (12GLCGM) é uma homenagem às protagonistas femininas que deixaram sua marca no mundo literário, transformando a imagem da mulher, trazendo uma mensagem de empoderamento e força e promovendo reflexões. O Desafio surgiu desta lista com algumas adaptações. No post de hoje, teremos "A História Secreta da Mulher Maravilha" de Jill Lepore.

Jill Lepore é mais conhecida no meio acadêmico, onde atua como historiadora há mais de vinte anos. Ela é especializada em história da política e do comportamento humano, mas ficou mundialmente conhecida quando escreveu a história de William Moulton Marston, o criador da Mulher Maravilha. 


Marston, embora atualmente seja conhecido por ter criado uma das personagens mais icônicas do universo pop, começou sua carreira inventando o polígrafo, o famoso detector de mentiras. PhD em Psicologia, Marston também era popular por causa de seus experimentos sociais como, por exemplo, medir a pressão sanguínea de loiras e morenas enquanto estas assistiam a um filme romântico, para determinar qual dos dois tipos de mulher era mais "excitável". Sua carreira profissional, como mostra Jill Lepore, teve muitos altos e baixos e era bastante instável, como a própria personalidade de Marston. Ele era motivo de chacota no meio acadêmico, que não lhe dava credibilidade. Assim, rapidamente criei uma antipatia por Marston e, para mim, a verdadeira criadora da Mulher Maravilha foi Olive Byrne, mas chegarei nela logo mais.

Marston era casado com duas mulheres - Elizabeth Holloway e Olive Byrne - mas, como a poligamia é algo proibido por lei, no papel ele era casado somente com Elizabeth. Logo no início da leitura, é fácil perceber como as duas mulheres eram muito à frente de seu tempo e tiveram suas doses de polêmica e revolução. Por isso, este post será dedicado a elas.

Elizabeth Holloway (Saddie)
Desde cedo, Elizabeth era insatisfeita com a posição inferior das mulheres na sociedade. Em uma época que quase nenhuma mulher podia estudar, Saddie foi uma das três únicas três mulheres que se formaram advogadas nos Estados Unidos no início dos anos 40. Ela também estudou Psicologia, momento em que ajudou Marston a desenvolver o polígrafo. Embora ela tenha feitos contribuições essenciais para a invenção do detector de mentiras, quem levou todo o crédito foi Marston, já então seu marido. 
Saddie era fascinada por mitologia grega, e esta influência é visível em Mulher Maravilha, sobretudo a criação da ilha de Themyscira e o fato da Mulher Maravilha chamar-se Diana, a Deusa da Caça. Sobretudo nas primeiras tirinhas da HQ de Mulher Maravilha, é possível detectar vários elementos da mitologia grega nas histórias e Marston, nas entrevistas que concedia na época, dava os créditos à Saddie. Jill Lepore, ao longo do livro, ilustra vários pontos da biografia com as tais tirinhas, mostrando para o leitor as referências que menciona. 
Saddie também participou ativamente do movimento sufragista e foi sua idéia colocar a Mulher Maravilha concorrendo à presidência dos Estados Unidos, numa das mais icônicas edições da heroína.
Saddie apaixonou-se por Olive Byrne e, pouco depois, Marston também. Os três, então, começaram uma relação poliamorosa que durou até o final da vida deles. E detalhe: Saddie morreu com cem anos.
Ela também não concordava que as mulheres deveriam ser mães e abdicar da carreira profissional. Desta forma, ela e Olive chegaram num arranjo: Olive ficava em casa cuidando dos filhos que as duas tiveram de Marston, enquanto Saddie dedicava-se à carreira de advogada. Olive tinha uma natureza mais doméstica e nenhum interesse em trabalhar fora e, por isso, ficava em casa cuidando das crianças.
No entanto, como a poligamia é proibida, os filhos de Olive foram registrados como sendo de Saddie. Os garotos passaram grande parte da vida chamando Saddie de mãe e Olive de tia, até descobrirem a verdade sobre o relacionamento poliamoroso.
Saddie foi quem bateu o pé e insistiu que a heroína fosse uma mulher, e não outro homem superpoderoso como o Super-Homem.

Olive Byrne
Ela conheceu Saddie e Marston na universidade de Psicologia, quando fez estágio para ajudá-los em suas pesquisas. Na pesquisa, ela e outras estudantes de Psicologia se vestiam de bebês e eram submetidas à humilhação e constrangimento para, depois, darem seus depoimentos a Marston. Em algumas tirinhas da Mulher Maravilha dos anos 40, é possível ver fragmentos desta pesquisa, mas a Mulher Maravilha aparece para salvar as meninas dessa situação abusiva.
Também credita-se a Olive os braceletes da Mulher Maravilha, pois ela usava braceletes dourados em ambos os pulsos, braceletes estes que eram, inclusive, sua marca registrada.
Além dos braceletes, a cor dos cabelos e dos olhos, além da constituição física da heroína, também foram inspirados em Olive.
Olive teve dois filhos com Marston, enquanto Saddie teve um. Enquanto Saddie trabalhava, Olive tomava conta das três crianças e, mesmo sendo mãe de duas delas, aceitava ser chamada de "tia" para que ninguém descobrisse a poligamia de Marston ou o relacionamento amoroso entre ela e Saddie.
Quando Marston morreu, ela e Saddie continuaram o relacionamento e cuidaram dos filhos até sua morte. 

Assim, é fácil perceber porque a Mulher Maravilha é uma personagem tão relevante para o feminismo. Ela foi forjada por duas grandes mulheres que, infelizmente, passaram a vida sob a sombra do marido, que não teve escrúpulos em fazer das idéias delas as suas. Jill Lepore não disfarça suas críticas a Marston, tampouco sua admiração por Saddie que é, realmente, incrível e inspiradora. 

O livro de Jill Lepore é bastante rico em informações e é um colírio para os olhos. Há várias tirinhas das HQ's originais espalhadas pela obra, bem como sketches dos primeiros figurinos da Mulher Maravilha e de sua aparência. O livro também funciona como um pequeno manual sobre a história do feminismo, pois a própria concepção da Mulher Maravilha acompanhou o Primeiro Movimento Feminista, o que rende momentos incríveis de reflexão e esclarecimento.

Por tudo isso e, sobretudo, por Saddie e Olive, este livro sem dúvida mereceu fazer parte do desafio "12 Grandes Livros com Grandes Mulheres".

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