Depois de ver a série "Carbono Alterado" no Netflix, fui correndo para a livraria para comprar o primeiro volume da trilogia (ambos - livro e trilogia - com o mesmo nome da série), escrita por Richard Morgan. É uma ótima obra para os fãs de ficção-científica e de enredos policiais. Este post é a resenha do volume um.
Richard Morgan, escritor britânico de ficção-científica, é conhecido por ambientar suas obras em um ambiente de extropia, ou seja, uma sociedade onde o ser humano foi evoluído e modificado tecnologicamente de forma que se desenvolva além das expectativas das gerações anteriores. Por isso, espere encontrar o subtipo de ficção-científica cyberpunk não só nesta obra, como em Richard Morgan como um todo.
O primeiro volume da trilogia Carbono Alterado foi publicado em 2002. Além dos elementos cyberpunk, o enredo também mistura o estilo policial hardboiled, que aparece quando os policiais e/ou detetives tem uma atitude cínica, fria e racional diante de violência. Este clima pesado permeia todo o livro e é um prato cheio para quem gosta destas referências.
A premissa deste livro (e da trilogia) é um futuro pós-apocalíptico no qual duas evoluções tecnológicas principais acontecem: 1) os planetas próximos à Terra foram conquistados e colonizados pelos seres humanos, ampliando as dimensões do Sistema Solar e permitindo o trânsito, o comércio e as leis entre vários planetas. O protagonista da estória, Takeshi Kovacs, é do planeta chamado Mundo de Harlan, que foi anteriormente descoberto e colonizado por japoneses e eslavos. 2) O ser humano tornou-se imortal (ou quase). A alma das pessoas é arquivada em cartuchos e estes cartuchos fazem backups diários de todas as memórias, pensamentos e sentimentos daquela pessoa. Quando o corpo da pessoa morre, o cartucho é reinstalado em um novo corpo, e ela continua sua vida de onde o backup parou. A pessoa só morre definitivamente se o seu cartucho é destruído ou se ela é neocatólica, pois a religião não permite que a pessoa seja ressuscitada, tendo o seu cartucho incinerado.
Esta ideia do cartucho resulta em desdobramentos interessantes. Por exemplo, uma família pode colocar o cartucho de um avô falecido em algum corpo para que este avô passe o Natal com eles. Quando alguém comete um crime, a pessoa fica submersa em uma piscina com algo semelhante ao líquido amniótico esperando a sentença terminar para recuperar seu cartucho. Os ricos podem fazer diversos clones de seu corpo e colocar o cartucho neles, de forma que criam a ilusão de que são imortais (e ficam conhecidos como Matusas, as pessoas mais poderosas de todos os planetas). As pessoas das outras classes sociais hipotecam corpos, financiam, fazem empréstimo, e assim por diante, pois não podem garantir que terão um novo corpo parecido com o anterior.
Outro desdobramento criativo da obra é a ideia de que, quando uma pessoa fica louca, o que acontece é que seu cartucho sofre problemas de programação. Para a pessoa se curar, ela fica "hospedada" em apartamentos virtuais, fazendo terapia com Inteligências Artificiais, até que seu cartucho esteja OK de novo.
Agora que estamos contextualizados, vamos falar da estória deste livro. Kovacs ficou preso por 200 anos por crimes que cometeu contra o Protetorado (o governo) quando era um Emissário em Mundo de Harlan. De forma resumida, os Emissários eram forças militares especiais que tinham como objetivo derrubar o governo. Faltando 50 anos para acabar sua sentença, o Matusa Laurens Bancroft utiliza seu poder para tirá-lo do tanque e contrata Kovacs para investigar seu suicídio. Bancroft atirou na própria cabeça, deixando o cartucho ileso, antes de um backup e, por isso, não se lembra porque cometeu este ato e desconfia que alguém o assassinou. A polícia da cidade de Bay City já encerrou o caso com a hipótese de suicídio, mas Bancroft não acredita nesta versão.
É aí que entra a parte de detetive da estória. Kovacs começa a investigar quem seriam as pessoas que poderiam ter matado Bancroft ou provocado seu suposto suicídio e, com isso, começa a encontrar bandidos, prostitutas e profissionais que trabalham para Bancroft. Ele também se relaciona com a tenente Ortega, responsável por investigar o crime e ex-parceira e ex-namorada do corpo que Takeshi veste no momento, de Ryler. Ryler era policial e Ortega pagava a hipoteca de seu corpo, para que ela pudesse devolver-lhe o cartucho quando sua sentença terminasse (Ryler foi preso por não seguir as regras da polícia). Porém, Bancroft comprou o corpo de Ryler, enfurecendo ainda mais Ortega.
O único ponto que impediu que este livro fosse uma Sugestão de Leitura aqui no blog foi o meio truncado. Morgan parece ter se perdido ao escrever sobre a investigação do suicídio de Bancroft e, lá pela metade do livro, havia personagens e subplots demais para serem administradas. A trama foi ficando confusa e extensa, sendo retomada no final de uma forma mais afobada e confusa. Mas, mesmo isso não tira o mérito da obra, que é excelente. Morgan foi muito criativo em suas concepções de ficção-científica e soube tratar os elementos de cyberpunk com congruência e simplicidade.
Recomendo o livro e também a série. Vale a pena!
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