Desafio Livros pelo Mundo | Coréia do Norte: Para Poder Viver, de Yeonmi Park


O Desafio Livros pelo Mundo tem como objetivo divulgar a literatura fora do eixo EUA-Inglaterra e, assim, permitir que mais leitores conheçam novos escritores e novas culturas. No post de hoje, temos o vigésimo quinto país a fazer parte do Desafio, a Coréia do Norte, com o biográfico "Para Poder Viver" de Yeonmi Park.

A Coréia de Norte é conhecida como um dos países mais fechados do planeta e, principalmente, por causa do culto intenso a Kim Il-Sung e sua família, a dinastia que governa o país há mais de três gerações e instituiu uma das ditaduras mais bizarras da História. Assim, a literatura do país é virtualmente inexistente, pois só é permitido escrever/falar/cantar sobre o imperador. Por isso, quando me indicaram este livro, imediatamente pensei no Desafio.

"Para Poder Viver" é a autobiografia da norte-coreana Yeonmi Park. Hoje com 26 anos e ativista dos direitos humanos, a história do livro conta sua jornada até os 17 anos, contando a saga dela e de sua mãe para fugirem da Coréia do Norte em busca de liberdade e de condições básicas de sobrevivência.
Narrado em primeira pessoa, Yeonmi adota um tom objetivo e leve, mesmo quando toca em assuntos pesados como tráfico de pessoas e estupros. 
Em Hyesan, cansado da miséria em que viviam, seu pai saiu de uma vida de funcionalismo público - vistos como cargos privilegiados em um governo que cultua seu líder como um Deus - para dedicar-se ao comércio. Porém, o comércio na Coréia do Norte é ilegal e, por isso, o pai de Yeonmi é considerado como um contrabandista.
Quando sua irmã, Eunmi, foge para a China, ela e a mãe resolvem também sair da Coréia da Norte, através da fronteira com a Mongólia. Daí em diante, elas enfrentam tantos contratempos e tanta violência que é até difícil resumi-las em uma resenha. No final, elas encontram abrigo na Coréia do Sul, onde, enfim, conseguem construir uma vida com dignidade.

Por isso, resolvi destacar os fatos que mais me chamaram a atenção ao longo da leitura:

Quando Yeonmi vende a própria mãe
Em 2007, época em se passam os principais eventos desta biografia, o tráfico de pessoas nas fronteiras da China era frequente e estava fora de controle. Os receptadores esperavam pelas famílias desesperadas e desnutridas que vinham da Coréia da Norte e lhes davam esperança de que as coisas seriam diferentes.
Porém, ao chegarem na China, as mulheres eram negociadas como mercadorias, vendidas para "maridos" que, via de regra, eram homens abusadores e violentos que as tratariam como objetos pelo resto da vida.
Num dado momento da jornada, Yeonmi e sua mãe se vêem miseráveis e à beira de morrer de fome e, por isso, a única saída que encontram é vender a mãe. Yeonmi tem que discutir preço e forma de pagamento da mãe, que a essa altura "já estava velha e cansada demais para ter um bom preço". Sua mãe concorda em ser vendida e elas ficam separadas por muito tempo, até que os caminhos se encontram de novo.

Quando Yeonmi presencia o estupro da mãe
A mãe de Yeonmi foi violentada tantas vezes ao longo do seu relato que é difícil não sentir um nó no estômago quando lembro deste livro. Desde o momento em que elas decidiram passar a fronteira com a China, os atravessadores abusam das mulheres sucessivamente, como parte do "pagamento pela ajuda oferecida". Numa destas situações, Yeonmi assiste a tudo e confesso que quase desisti da leitura depois disso, porque me deu vontade de vomitar. Mas a forma como Yeonmi lidou com tudo isso chega a ser inspiradora, e sua narrativa mantém uma chama de esperança sempre acesa no leitor.

Assim, não é difícil perceber que não é uma leitura fácil nem delicada. O livro é um soco na cara atrás do outro e, embora o foco seja a crueldade do governo da Coréia do Norte, também fala muito da violência existente na China (que é menos discutida mas tão absurda quanto).
Além disso, o livro me fez pensar em como somos inseridos em sistemas de crenças que, muitas vezes, nem chegamos a questionar. Claro que, no caso de Yeonmi, esse sistema é mais bizarro e surreal, mas acho que todos nós temos um pouco disso no nosso dia-a-dia.

Enfim, a biografia dela permite muito debate. Se você leu também e quer conversar sobre isso, deixa aí nos comentários.

Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 

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