Já Li #81 - As Mulheres do Deserto, de Alice Hoffmann


O post de hoje é sobre um livro cheio de personagens femininas incríveis e inspiradoras. "As Mulheres do Deserto" de Alice Hoffman traz quatro mulheres cujos destinos se cruzam nos desertos.

"As Mulheres do Deserto" é considerado um romance histórico pois retrata acontecimentos verídicos do ano 70 d.C. (depois de Cristo) como o Cerco de Massada. Este cerco marcou o fim da guerra entre os romanos e os judeus, sendo que os primeiros ganharam, conquistando o território dos judeus e os expulsando para o deserto, onde tiveram que lutar pela sobrevivência. Os sicários, um grupo de judeus guerreiros que lutaram contra os romanos, foram notoriamente massacrados pela guerra e cometeram um suicídio coletivo que envolveu 900 pessoas, pois não queriam se entregar ao inimigo.

No livro, a estória é dividida em quatro partes, cada uma destinada a uma das mulheres do deserto: Yael, Aziza, Shirah e Revka. Os acontecimentos das vidas delas se entrelaçam ao longo de toda a narrativa, o que torna a leitura muito interessante. Afinal, desta forma, o leitor revê as mesmas cenas sob outras perspectivas, o que aprofunda as personagens e a estória em si. Farei uma breve descrição de cada uma das personagens.

Yael é a mulher que dá início ao livro. Sua principal característica é o "cabelo cor-de-fogo", considerado uma maldição pelo povo da época. Além disso, sua mãe morreu no parto e a combinação das duas coisas fez seu pai odiá-la. Ele quase a deixa para trás em Massada, entregue aos romanos, mas ela consegue fugir para o deserto, onde encontra um amor proibido. Yael tem um espírito livre e uma personalidade considerada "revolucionária" pelos demais, pois não acredita em família, amor ou casamento.

A seguir, temos a parte dedicada a Revka. Sua história é pesada pois ela presenciou o estupro e o assassinato de sua única filha pelos romanos, quando estes invadiram a cidade. Num ato de fúria, ela mata os ofensores e carrega a culpa destes pecados. Revka é uma mulher ferida e dolorida, saudosa da filha e que nunca se cansa de tentar resgatar a família que perdeu.

Aziza foi criada como menino pelo seu pai e adora o metal e as batalhas. Quando ela e sua família fogem do Cerco de Massada, ela não sabe "ser menina", tampouco se interessa pelas atividades que são tradicionalmente femininas. O que ela realmente almeja é fazer parte da luta de resistência dos judeus.

Por fim, Shirah é chamada de bruxa pois não segue o judaísmo. Pagã, ela entende de poções e ervas e, por causa disso, é renegada da sociedade. Para mim, Shirah era a personagem mais misteriosa e relevante de toda a trama (é ela que conecta todas as estórias) e fiquei frustrada quando vi que a parte dela era a menor de todas.

Todas elas se encontram quando vão trabalhar no pombal, na aldeia formada no meio do deserto pelos judeus expulsos. As pombas são a única fonte de adubo para a terra e de ovos para a pequena comunidade, mas as mulheres que cuidam do pombal são consideradas indignas e impuras. O relacionamento entre as quatro mulheres não se estreita muito, pois todas elas estão absorvidas pelos próprios dramas e sofrimentos, mas há um clima de sororidade e empatia. 

No entanto, apesar do belíssimo conteúdo apresentado por Alice Hoffmann, minha leitura teve altos e baixos e acho que isso aconteceu por causa do ritmo da escrita. Há muitas descrições desnecessárias (afinal, convenhamos, quantas vezes precisamos ler sobre a areia do deserto ou o cocô das pombas?) e as cenas demoram a se desenrolar. Precisei superar algumas dispersões da minha atenção para prosseguir até o fim do livro.

Mas, apesar disso, é uma leitura que vale a pena. Alice Hoffmann toca em diversos pontos que são tremendamente relevantes para as discussões atuais sobre o papel da mulher: estereótipos, preconceitos, violência doméstica, abuso, falta de oportunidades para o futuro, limitações impostas pela sociedade, dentre outros. Yael, Revka, Aziza e Shirah são personagens fantásticas e, aos poucos, fui me apegando a cada uma delas como se eu as conhecesse. Além disso, há lindos momentos de emoção e poesia ao longo da estória, muito bem escritos por Alice.

Somando isso ao peso histórico do enredo, é uma leitura que recomendo.

Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 

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