12GLCGM | A Guerra Não Tem Rosto De Mulher, de Svetlana Aleksiévitch
O Desafio 12 Grandes Livros com Grandes Mulheres (12GLCGM) é uma homenagem às protagonistas femininas que deixaram sua marca no mundo literário, transformando a imagem da mulher, trazendo uma mensagem de empoderamento e força e promovendo reflexões. O Desafio surgiu desta lista com algumas adaptações. No post de hoje, teremos "A Guerra Não Tem Rosto de Mulher" de Svetlana Aleksiévitch.
Svetlana Aleksiévitch é uma jornalista investigativa nascida na Bielorússia e é conhecida por suas obras de não-ficção. Em 2015, ela ganhou o Prêmio Nobel de Literatura com "A Guerra Não Tem Rosto de Mulher" e, desde então, tem figurado nas listas de bestseller do mundo todo. Ao longo de sua carreira como jornalista, Svetlana se especializou em recolher e consolidar depoimentos de testemunhas e ela os transforma em livros. Ela já reuniu testemunhos sobre a guerra do Afeganistão ("Zinky Boys: Vozes Soviéticas de uma Guerra Esquecida") e sobre o desastre de Chernobyl ("Vozes de Tchernóbil: A História oral do desastre nuclear").
"A Guerra Não Tem Rosto de Mulher" é um livro não-ficcional que reúne dezenas de depoimentos de mulheres soviéticas que participaram da Segunda Guerra Mundial, publicado em 2015. Muitas delas eram partisans, ou seja, eram membros de tropas irregulares que se formavam com o objetivo de resistir à invasão de um determinado país, atrapalhando a ocupação do território soviético pela Alemanha. O objetivo de Svetlana com esta obra é trazer uma "visão feminina" sobre a guerra que, via de regra, tornou-se um movimento visto predominantemente sob o ponto-de-vista masculino. Logo no início, Svetlana conta que nenhuma editora acreditava em seu projeto, pois, segundo elas (as editoras), o público queria saber apenas das batalhas e das vitórias. As editoras, claro, estavam erradas, como o sucesso da obra confirma.
O primeiro paradigma que a obra desconstrói é a noção de que toda mulher que vai para a guerra é enfermeira, e as batalhas são efetivamente travadas por homens entre homens. Svetlana se preocupou em dar maior destaque aos relatos de mulheres que fugissem do clichê de serem enfermeiras na guerra e, assim, conhecemos várias atiradoras de metralhadora, sargentos, motoristas de tanque, soldados, pilotos de artilharia antiaérea, dentre outros postos militares. Estas mulheres foram recusadas várias vezes nos alistamentos mas, depois de muita insistência, os batalhões começaram a aceitá-las. Logo no início dos treinamentos, elas já deixavam claro que estavam à altura do desempenho dos homens e que não fazia nenhuma diferença o fato delas serem mulheres.
O segundo paradigma quebrado neste livro é o de que as mulheres não são violentas e não são "feitas para matar como os soldados homens". Os depoimentos são pesadíssimos, cheios de violência, e carregados de angústia e arrependimento. Grande parte das mulheres, ao serem entrevistadas por Svetlana, já estavam na meia-idade e lembram-se de sua juventude marcada por morte e sangue. Várias delas relataram vontade de matar e ódio, ao se depararem com os inimigos. Outras tantas disseram que, na hora de assassinarem os alemães, elas nada sentiram e só depois que elas percebiam o que tinham feito.
Outro aspecto interessante que a obra traz é o pós-guerra. Para os homens, ter um histórico militar e ter combatido na Segunda Guerra Mundial é motivo de orgulho. Já para estas mulheres, o pós-guerra foi marcado por preconceito, pois as pessoas tinham medo delas: as famílias ficaram assustadas com o fato delas terem ido lutar nos campos de batalha, os homens não-militares não queriam se casar nem ter filhos com elas, os vizinhos as ignoravam e era difícil arrumar trabalho. Por isso, muitas das mulheres dos relatos acabaram constituindo família com ex-colegas de front, os únicos que pareciam compreender sua coragem e suas virtudes.
A leitura do livro, em si, pode se tornar maçante. Svetlana optou por deixar os depoimentos crus e sem edição e, além disso, ela não romantiza nenhum relato. Entendo as escolhas que a autora fez para manter a integridade e a força das biografias destas mulheres mas, por outro lado, ler citação atrás de citação começou a se tornar cansativo para mim. Acredito que ela pudesse ter agrupado os depoimentos, fornecido algumas contextualizações histórias e, até mesmo, ter se aprofundado em cada uma das mulheres escolhidas. Como são muitas mulheres, depois de um certo tempo, elas pareciam sempre a mesma pessoa.
Contudo, a estrutura da obra não tira seu valor. O livro faz juz ao Desafio 12 Grandes Livros com Grandes Mulheres, pois traz uma visão nova, relevante e surpreendente sobre o papel das mulheres na guerra. Elas são exemplos de patriotismo, força e coragem, não só por terem combatido na Segunda Guerra Mundial, como por terem aguentado as consequências de suas escolhas por toda a vida. A leitura é pesada e angustiante, mas estas mulheres merecem ser ouvidas e, por isso, recomendo muitíssimo a leitura.
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