Sugestão de Leitura | Trilogia Comando Sul, vol 1: Aniquilação, de Jeff VanderMeer
Uma ficção-científica apenas com personagens femininas, cheia de mistérios e perguntas sem resposta. O primeiro volume da Trilogia Comando Sul, "Aniquilação", é uma excelente obra de Jeff VanderMeer e este post é sobre ele.
O gênero literário da Trilogia Comando Sul é categorizado, por alguns críticos literários, de new weird. O new weird se caracteriza por cenários urbanos, de uma realidade alternativa, criando novas sociedades mais complexas e sem nenhum tipo de romantização e, principalmente, por prover finais abertos, sem fechamento. Por isso, se você é do tipo de leitor que precisa obter respostas para todos os mistérios de uma obra ou sente a necessidade de um fim na estória, talvez seja melhor deixar "Aniquilação" para lá.
O Comando Sul que dá nome à trilogia é uma agência secreta que gerencia expedições a uma área da Terra chamada Área X. Nesta área, algum evento bizarro aconteceu, mas ninguém conseguiu obter uma explicação para ele: formou-se uma fronteira invisível, como um campo magnético super potente, e só o Comando Sul possui a fórmula que permite que seres humanos a atravessem. Além disso, a natureza tomou conta do local delimitado pela fronteira, comportando-se de forma atípica e anormal para os padrões terrestres. As pessoas que aceitam participar das expedições se suicidam, assassinam umas às outras ou voltam de lá esvaziadas, sem personalidade e sem sentimentos.
Publicado em 2014, "Aniquilação" conta a estória de uma expedição composta por quatro mulheres: uma bióloga, uma antropóloga, uma psicóloga e uma topologista. Nenhuma delas recebe um nome próprio ao longo da trama e são referenciadas por suas profissões, uma vez que elas não sabem os nomes umas das outras na expedição. O objetivo deste é mantê-las imparciais e distanciadas da realidade que viviam antes de entrar na área X. A personagem principal é a bióloga, que conta os estranhos acontecimentos da área X em um diário.
O Comando Sul explica a elas, nos testes intensos e pesados que precisaram fazer antes de entrar na expedição, que elas são a 12ª turma a entrar na área X. A turma anterior, composta pelo marido da bióloga, voltou de lá insana. A psicóloga é a líder do grupo.
Elas encontram uma torre subterrânea e resolvem explorá-la. Nas paredes internas da torre, frases e palavras são escritas com microrganismos vivos que a bióloga não consegue identificar. As frases são misteriosas e parecem trechos de um macabro texto religioso. Ao entrar em contato com estes microrganismos, a bióloga sente-se fisicamente diferente, mas não conta para ninguém. Depois, à noite, ela ouve a psicóloga hipnotizando-as, induzindo-as a acreditarem que a torre é feita de pedra quando, na realidade, é um organismo gigante. A bióloga não se afeta pela hipnose e começa a desconfiar de toda a missão da expedição.
Na manhã seguinte, a antropóloga desaparece, assim como a psicóloga. Depois de uma briga com a topologista para decidir o que fazer, a bióloga decide investigar os desaparecimentos sozinha. Assim, ela encontra a antropóloga derretida até a morte dentro da torre, e acredita que a psicóloga a levou até a morte propositalmente, através de hipnose. A bióloga segue para o farol, o único ponto de referência da Área X, pois acha que a psicóloga está escondida lá.
Como o livro tem apenas 139 páginas, é difícil contar mais sobre a estória sem dar spoilers. De forma geral, no farol, a bióloga descobre uma pilha enorme de diários deixados pelas expedições anteriores e, ao lê-los, ela começa a perceber que o Comando Sul e a psicóloga contaram uma infinidade de mentiras para elas, e que á Área X é mais bizarra e mais mortífera do que ela esperava.
A personagem da bióloga é muito interessante. Ela gosta de ficar sozinha e de isolar-se da sociedade, daí o motivo por ter se voluntariado à expedição. E, também por este motivo, ela divorcia-se do marido antes de ele partir para a 11ª expedição. Sua paixão pela natureza vai muito além dos estudos e da vida acadêmica e ela passa toda a vida buscando uma conexão maior com o ambiente ao seu redor, e encontra esta conexão na Área X. Ela é uma personagem bastante profunda e que consegue carregar a estória nas costas.
Os elementos de ficção-científica (ou de new weird) são assustadores e fascinantes. Gostei muito da forma como VanderMeer conseguiu construir uma natureza absurda e amedrontadora que, conforme a estória avança, vai deixando misteriosas pistas para o leitor. Como o livro é narrado do ponto-de-vista da bióloga e ela não compreende inteiramente o que está acontecendo na Área X, o leitor não pode esperar desfechos precisos nem respostas para todas as perguntas. VanderMeer deixa uma explicação em forma de hipótese, que a bióloga registra no seu diário, e esta hipótese é a única diretriz que o leitor terá para compreender o enredo.
Foi uma leitura que devorei em dois dias e adorei. Recomendo muito a leitura deste livro e mal posso esperar para ler o segundo volume da trilogia, "Autoridade".
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