Já Li #145 - Os Homens Explicam Tudo Para Mim, de Rebecca Solnit

 

Rebecca Solnit escreveu o que costuma dar errado nas conversas entre homens e mulheres em seis ensaios que compõem o livro "Os Homens Explicam Tudo Para Mim". Os ensaios falam sobre homens que erroneamente presumem que sabem das coisas e, também erroneamente, assume que as mulheres não - o que hoje conhecemos pelo nome de mansplaining. Na resenha de hoje, falarei um pouco sobre a minha opinião sobre este livro.

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Rebecca Solnit frequentemente comenta que cresceu em um lar abusivo, onde sofria violências de todos os tipos do seu pai. Assim, quando tornou-se escritora, ela começou a se engajar em diversos movimentos e organizações contra a violência às mulheres. "Os Homens Explicam Tudo Para Mim", publicado em 2014, é um de seus livros mais populares até hoje, onde ela reúne seis ensaios - publicados anteriormente em outras mídias - sobre como (alguns) homens invalidam as experiências, opiniões e conquistas das mulheres através do discurso. 

Acho que a força deste livro - e a razão pela qual ele é tão popular - é que seu conceito principal fará sentido para muitas mulheres. Sempre vejo na internet mulheres contando suas experiências sobre como os homens tentaram explicar coisas para elas, com aquele tom de superioridade que é tão irritante. É bastante inspirador quando alguém coloca em palavras uma experiência que até agora você não sabia como explicar, ou que você achava que só você passava por aquilo.

Porém, conforme eu ia avançado pelos ensaios, não gostei de dois aspectos desse livro.
O primeiro é que Solnit foca muito em estatísticas, sobretudo relacionadas aos estupros nos Estados Unidos. E dentro disso há alguns problemas adicionais: a relação que ela faz entre mansplaining e estupro é desenvolvida rapidamente, sem muito aprofundamento, e Solnit parte do princípio que o leitor entendeu a linha de raciocínio dela em apenas um parágrafo. Depois, ela joga estatística atrás de estatística, focando nos Estados Unidos e talvez na África, mas esquecendo de considerar que tais informações são irrelevantes para leitores de outros países e, além disso, que ler números é um saco. E, por fim, partindo do princípio que você teve paciência para superar as estatísticas, Solnit não provê nenhuma reflexão, fechamento ou aprofundamento delas tampouco, e segue adiante para o próximo ensaio sem nenhuma amarração.

A outra coisa que me incomodou foi a falta de interseccionalidade. Há um trecho do livro em que ela chega a dizer que "a violência não conhece raça, religião ou nacionalidade, apenas gênero". Para quem não sabe, interseccionalidade leva em consideração os diversos aspectos que compõem o contexto social de uma pessoa ao analisar problemas como violência, fome, miséria, desemprego, etc. Assim, Solnit deveria dizer, por exemplo, que a violência afeta mais as mulheres do que os homens, mas que afeta muito mais [insira estatística aqui, aí sim relevante para a discussão] mulheres negras. A ausência dessa camada de análise é algo impensável para uma escritora feminista dos dias de hoje, e fiquei me perguntando se Solnit nunca leu "Mulheres, Raça e Classe" de Angela Davis.

E é curioso que o ensaio que eu mais tenha gostado do livro é o que fala de Virginia Woolf, mas que desvia completamente do tema central proposto pela obra. Foi um momento de fangirling da Solnit pela Woolf - o que, claro, apóio - mas Solnit deixou passar tantas conexões, tantas reflexões importantes sobre Woolf que conectariam com o tema. Há inúmeros relatos de Woolf sobre como ela foi sufocada pelas palavras e decisões do marido e de seu médico, e como ambos acabaram por sufocar sua identidade ao longo do tempo. Teria sido muito poderoso.

Quando cheguei ao final da leitura, fiquei com uma sensação de frustração ou, melhor ainda, de conversa que acaba pela metade. Parece que fica faltando alguma coisa - uma conclusão, um momento inspirador, um convite aos homens para participarem da conversa - não sei bem o quê. E aí, por isso, acabei não gostando da leitura, e acho que também não recomendaria este livro a ninguém. A coisa toda me soou como um "feminismo de internet", sem substância, e achei que Solnit poderia ter feito melhor do que isso.

Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 

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