Sugestão de Leitura | A Vida Mentirosa dos Adultos, de Elena Ferrante


Elena Ferrante nunca decepciona. Recentemente, li "A Vida Mentirosa dos Adultos" em quatro ou cinco dias, eu não conseguia deixar o livro de lado por muito tempo que me via pensando nas personagens. Mais do que isso, eu analisava minha própria vida e família com os olhos da Ferrante. Por isso, só para não perder  costume, mais uma vez a Sugestão de Leitura é dela.

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 "A Vida Mentirosa dos Adultos" foi publicado em 2019 e é narrado em primeira pessoa por Giovanna. No início do livro, ela é uma criança/pré-adolescente que, aos poucos, descobre segredos e mentiras de sua família, e tais descobertas a levam para a adolescência e para o início da vida adulta. Nesse sentido, a leitura me lembrou um pouco de "O Apanhador do Campo de Centeio" de J. D. Salinger, quando a história começa e termina de repente, sendo apenas um recorte da vida de um personagem, que não saberemos como termina. 

A história começa quando Giovanna escuta seu pai, até então seu grande herói, comparando-a com Vittoria, a irmã que odeia, sempre descrita como mesquinha, feia e violenta. Esse comentário desestabiliza Giovanna e ela decide conhecer pessoalmente Vittoria, para saber se realmente está ficando parecida com a tia e se ela é tão ruim quanto seu pai e sua mãe falam. Giovanna enfrenta resistência de ambos mas, enfim, se aproxima de Vittoria, estabelecendo uma relação que já nasce confusa e carregada de sentimentos negativos.
Ao entrar na vida de Vittoria, Giovanna também conhece Margherita e seus três filhos. Vittoria era a amante do marido de Margherita e, depois da morte dele, as duas mulheres resolvem se unir em sua dor (de luto e traição) para criar três jovens completamente diferentes entre si. Cada um dos filhos de Margherita traz uma lição diferente para Giovanna, mas o foco maior da história é em Giuliana.
Giovanna tem duas melhores amigas desde que é criança, Ida e Angela, e seus pais, Constanza e Mariano, são os melhores amigos de seus pais. Ela descobre que seu pai tem um caso com Constanza desde antes deles terem filhos, há mais de quinze anos. Mariano, para se vingar, dá em cima da sua mãe. Com essa descoberta, começa o crescimento de Giovanna.
Giovanna se apaixona pelo namorado dela, Roberto (que achei bastante parecido com o Nino da "Série Napolitana", acho que Ferrante tem uma quedinha por intelectuais misóginos sedutores #quemnunca).

Primeiro, é lógico que a família dessa história é completamente disfuncional. Eu ia comentar que todas as famílias de Ferrante são, mas depois fiquei pensando se na vida real também não é assim, e a gente só finge que a nossa própria família não é para evitarmos sofrimento (eu avisei que fiquei refletindo muito depois de ler a história). 

Dito isso, Giovanna é uma personagem principal difícil de gostar, mas eu acho que Ferrante fez isso de propósito. Quem está acostumadx com sua obra sabe que, com ela, os personagens nunca podem ser classificados em bons ou ruins, e aqui isso acontece de novo. Houve momentos que me identifiquei muito com Giovanna e, em outros, a detestei, mas mesmo assim continuei entretetida na leitura, fosse porque eu queria sua redenção ou porque queria que ela se autodestruísse de uma vez.
Vittoria, por outro lado, que é feita para ser odiada, eu gostei bastante. Ferrante fez um trabalho maravilhoso na construção dela e eu sentia, genuinamente, que ela era uma pessoa real e não uma personagem de um livro. E Vittoria aparece na medida certa no enredo, nem muito nem pouco, e ajuda a empurrar Giovanna em direção à vida adulta de um jeito cru e abrupto.

Outra coisa que pensei foi que, se na "Série Napolitana" o ponto-de-vista da vida foi dado pelas pessoas pobres, nesse ele é dado pelas pessoas da elite e, de um jeito ou de outro, ninguém se salva. É como se Ferrante atestasse que a natureza do ser humano é essencialmente corrupta, independente das origens, classe social ou educação que a pessoa recebeu. (Concordo? Totalmente).

Gostei também da forma como Giovanna descobre a a sexualidade. Começa doce e despretensiosa com Angela e termina fria e pragmática com Rosário.

E, por fim, enquanto lia, me senti tóxica. E eu acho isso um mérito enorme da Ferrante, que consegue impregnar o leitor com suas palavras e estilo. O que você lê fica grudado em você, como se o leitor fizesse parte da história e causador do sofrimento de todos. Eu amei cada segundo da leitura e nunca vou parar de recomendar Ferrante para todo o mundo.

Avaliação do Perplexidade e Silêncio: 

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